sexta-feira, 5 de abril de 2013

Protestos fazem 'poderosos' tremer na Europa

Angela Merkel é comparada com Hitler em boneco feito por manifestantes em Lisboa, em Portugal


Por Hugo Souza

A exemplo dos seus vizinhos de Península Ibérica, nomeadamente o povo português, os espanhois vêm protagonizando nos últimos meses - a bem da verdade, nos últimos anos - ações coordenadas de classe em defesa dos seus direitos historicamente conquistados e do patrimônio público nacional, no contexto da crise profunda e generalizada dos monopólios.

Crise esta que, na Espanha, bem como em Portugal e em outros países ora sob um arrocho sem precedentes na história do capitalismo europeu, assume a nuance de "crise da dívida", expressão que denota a absoluta incapacidade de os Estados conseguirem pagar suas dívidas públicas sem a ajuda de terceiros, nomeadamente o FMI e o Banco Central Europeu, sendo isto resultado do aumento irracional dos níveis de endividamento nas últimas décadas para manter girando a roldana da economia burguesa há tempos agonizante, o que escancara a irracionalidade do próprio sistema de exploração do homem pelo homem.

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Quando o rastilho de pólvora da crise internacional estourou no Estado espanhol (e em Portugal, na Grécia, na Irlanda, etc), as classes dominantes começaram a lançar mão de medidas antipovo sem fim, anunciadas quase que diariamente, um golpe atrás do outro, tudo sob o chapéu de sucessivos "pacotes de austeridade".

É contra esta infâmia que o povo europeu não sai das ruas, em protestos cada vez mais agigantados. No dia 10 de março, o território espanhol tremeu sob as marchas de cerca de 300 mil trabalhadores em mais de 60 cidades diferentes. Os manifestantes marcaram um "basta" à escalada do desemprego, que na Espanha já aflige seis milhões de pessoas (mais de 26% da população; mais de 50% entre os jovens, ou seja, pessoas com menos de 25 anos de idade) e expressaram seu repúdio aos sucessivos cortes na educação, na saúde e da seguridade social.

França: operários ocupam entidade patronal

 

Dois dias antes das marchas coordenadas na Espanha que fizerem tremer a espinha do "primeiro-ministro" Mariano Rajoy, no vizinho espanhol do leste uma ação classista encheu o proletariado local de orgulho e inspiração. No dia 8 de março cerca de 200 operários da fábrica da montadora de carros Peugeot/Citroën em Aulnay-sous-Bois, Paris, capital francesa, ocuparam as instalações da União das Indústrias e Artes da Metalurgia, uma entidade patronal, em protesto contra o fechamento da fábrica, intenção que a Peugeot/Citroën pretende levar a cabo em 2014.

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Na fábrica que a companhia transnacional quer fechar, contando com a cumplicidade da administração "socialista" de François Hollande, para incrementar os lucros dos seus acionistas trabalham nada menos do que 2.800 pessoas. A ocupação da União das Indústrias e Artes da Metalurgia se deu no contexto de um incremento das ações dos operários em defesa do seu emprego. Entre estas ações está uma greve de fôlego, que naquele 8 de março já durava oito semanas. No alto da fachada da entidade patronal ocupada, os trabalhadores estenderam uma enorme faixa com os dizeres: "Os operários não são desordeiros, os desordeiros são os patrões".

Portugal também voltou a ser palco de um grande protesto contra as medidas antipovo sem fim. No dia 15 de março milhares de pessoas se reuniram em Lisboa para protestar contra o draconiano processo de demissão coletiva de funcionários públicos e contra os drásticos cortes de salários e de direitos dos trabalhadores.

Um dia antes, em 14 de março, uma multidão formada por pessoas de várias nacionalidades da Europa ocupou as cercanias da sede da União Europeia, em Bruxelas, na Bélgica, no momento do início do Conselho Europeu, que reuniu na capital belga os chefes de Estado e de governo da UE, para protestar contra a precarização geral do trabalho, contra as demissões em massa e o arrocho salarial.

Acossados e acuados, os poderosos da União Europeia já sentem os joelhos fraquejarem ante a autoridade das ruas. Ali mesmo, em Bruxelas, no primeiro dia do Conselho Europeu, enquanto a massa fazia barulho do lado de fora, do lado de dentro das paredes da União Europeia do capital monopolista o primeiro-ministro de Luxemburgo e presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, confidenciou à imprensa burguesa o seu maior temor: "corremos o risco de ver uma revolução".


quarta-feira, 3 de abril de 2013

Chipre: que há por trás do silêncio da mídia

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Ensaio jornalístico de Roberto Savio revela quais as causas da crise; como oligarquia financeira impôs seus interesses; por que Alemanha pode ter conquistado vitória de Pirro.

Por Antonio Martins

Vista pelos jornais comerciais, a crise financeira vivida por Chipre, nas duas últimas semanas, parece um fenômeno tão inesperado e imprevisível quanto a queda de um meteoro na Rússia, em fevereiro. Surgiu do nada; não podia ser evitada; causou um número importante de vítimas; mas não afetou, no fim das contas, a rotina do planeta: será esquecida em breve e não há lições a tirar de sua passagem. Fundador da Agência IPS, participante destacado do movimento por uma Nova Ordem Mundial da Informação e Comunicação, nos anos 1970 e 80, o jornalista ítalo-argentino Roberto Savio percebeu que esta imagem pretendia ocultar algo.

Mas não se limitou a vociferar contra os oligopólios da mídia: foi à luta. Dedicou três dias inteiros da semana passada a uma busca minuciosa de informações. Como ferramentas, usou sua compreensão dos mecanismos financeiros contemporâneos e os infinitos terabytes de informação caótica disponíveis na internet. Produziu um ensaio esclarecedor e alarmante, que Outras Palavras está traduzindo e publicará nos próximos dias. Vele a pena antecipar ao menos três de suas conclusões:

1. Chipre não protegia investidores sujos, nem quebrou por servir à lavagem de dinheiro:

A “explicação” mais comum da mídia para a quebra do pequeno país insular é a suposta proteção que dava a investimentos de origem duvidosa, em especial os ligados às máfias russas. Não passa de mito, demonstra Savio. Segundo o Moneyval, organismo oficial do Conselho da Europa que avalia medidas de proteção contra lavagem de dinheiro, Chipre é um dos poucos países que aplica todas as regras definidas para coibir tal prática. Sua avaliação no Índice de Sigilo Financeiro [Financial Secrecy Index] é 408,5, o que indica muito mais transparência que no Reino Unido (616,5), Alemanha (669,8) ou Suíça (1879,2, numa escala em quanto mais alto o índice, mais opaco é o sistema).

O mimo da ilha aos investidores era outro: impostos extremamente reduzidos: 6 a 7% ao ano, ou metade dos 12% na Irlanda, conhecida por caçar investimentos concedendo-lhes privilégios tributários. A partir de 2004, quando Chipre ingressou na União Europeia, esta oferta foi aceita com entusiasmo pelas finanças globais. Elas inundaram a tal ponto a ilha de dinheiro que o volume de depósitos bancários chegou a oito vezes o PIB. A partir de 2008, uma crise financeira internacional prolongada impôs perdas sucessivas a estes depósitos e acabou tragando os bancos cipriotas em sua espiral.

2. Oligarquia financeira e governos europeus manipularam politicamente a crise:

Os 10 bilhões de euros oferecidos agora pela União Europeia (UE) para o “resgate” de Chipre são rigorosamente insignificantes: 17 vezes menos que o empréstimo à Grécia, ou 0,06% do PIB europeu. Desde junho de 2012, o então presidente cipriota, Dimitris Christofias, havia pedido assistência à UE. Mas as eleições presidenciais na ilha estavam próximas, e Christofias era o único chefe de Estado do Velho Continente eleito por um Partido Comunista.

O empréstimo foi adiado, enquanto a crise se agravava.  Em janeiro de 2013, diversos chefes de Estado europeus conservadores — inclusive a alemã Angela Merkel — visitaram a ilha para participar da campanha do opositor Nicos Anastasiades. Advogado ligado ao sistema financeiro, ele tornou-se presidente em 25/2, no segundo turno das eleições. Então, fez-se o empréstimo.

3. Uma decisão inédita pode abalar confiança na Europa e no sistema financeiro:

Na definição das condições para o “resgate”, prevaleceu a posição alemã. Criou-se um precedente. Pela primeira vez, a UE exigiu que seu empréstimo (os € 10 bilhões) seja complementado por dinheiro retirado dos próprios depositantes nos bancos cipriotas (eles perderão € 7 bilhões).  Em longa entrevista sobre o caso, o ministro das Finanças da Holanda (fortemente aliada a Berlim) anunciou que tal tipo de arranjo é a “nova estrutura” que será usada nos futuros empréstimos.

Isso valerá para Espanha e Itália, cuja situação financeira continua a se agravar? Dezenas de milhões de espanhóis e italianos perderão parte do que têm nos bancos, como ocorreu no corralito argentino de 2001? Savio vê na hipótese uma esperteza e, ao mesmo tempo, uma temeridade. Como os bancos alemães são vistos como os mais seguros da Europa, o precedente pode favorecê-los fortemente, no curto prazo. Se agora os depósitos bancários não estão mais garantidos pelos Estados europeus, é melhor guardar dinheiro nos bancos fortes, pensarão os depositantes. Ou, como disse o Nobel de Economia Paul Krugman, é como anunciar, num aviso de neon: “Traga seu dinheiro para o banco mais seguro dos países mais seguros, como a Alemanha ou a Suíça”…

Porém, que futuro terá uma Europa que radicaliza a tal ponto o abismo entre um punhado de países que ganham com a crise e a grande maioria, sob risco constante de ser tragada? E que credibilidade moral terá um sistema financeiro que especula desenfreadamente com o dinheiro de seus depositantes; alimenta, com os ganhos obtidos, salários e mordomias milionárias de seus altos executivos; mas, diante de eventuais prejuízos, avança sobre o bolso dos clientes?

Roberto Savio ainda não tem as respostas, mas aponta um dos desafios de nossa época: “ninguém ousa colocar de novo, na garrafa, o gênio da oligarquia financeira”.


terça-feira, 2 de abril de 2013

Iraque: os senhores da guerra, dez anos depois



Por Carta Maior 

 

Onde estão hoje e o que fazem os protagonistas da Cúpula dos Açores em 2003 – George W. Bush, Tony Blair, José Maria Aznar e Durão Barroso –, que deram luz verde à invasão do Iraque? Dez anos depois, o números de mortos de civis iraquianos gera dúvidas, mas está na casa das centenas de milhares

Lisboa – Em 15 de março de 2003, George W. Bush, Tony Blair e José Maria Aznar, tendo Durão Barroso como anfitrião, reuniram-se nos Açores e lançaram o ultimato que desencadeou a invasão do Iraque, mesmo sem o mandato das Nações Unidas. Dez anos depois, apenas Barroso se mantém em funções políticas, mas fora do seu país.

Tony Blair queixa-se das ofensas que ouve na rua

O ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair reconheceu numa entrevista recente à BBC que dez anos depois da invasão do Iraque ainda encontra pessoas “muito ofensivas” em relação a ele, e que desistiu de convencê-las de que a decisão de invadir foi correta. O entrevistador perguntara-lhe se se importava de que as pessoas o chamassem de mentiroso, de criminoso de guerra, e se era difícil andar na rua com tranquilidade.

A verdade é que Blair já passou pelo menos por quatro ocasiões em que cidadãos tentaram dar-lhe voz de prisão, executando uma “prisão cidadã” por crimes contra a paz. A iniciativa foi lançada pelo site Arrest Blair, que lista quatro objetivos a obter com as “prisões cidadãs”: 1) lembrar que a justiça ainda não foi feita; 2) mostrar a Blair que os assassinatos maciços de que ele é responsável não serão esquecidos; 3) pressionar as autoridades do Reino Unido e dos países por onde ele passa a processá-lo por crimes contra a paz; 4) desencorajar outros a repetirem o mesmo crime.

Criminoso de guerra

As acusações de que Blair é um criminoso de guerra têm-se multiplicado e quem o faz não são só os ativistas antiguerra. Personalidades mundiais, como o arcebispo Prêmio Nobel da Paz Desmond Tutu, um dos líderes do movimento antiapartheid na África do Sul, dizem o mesmo. Tutu foi mesmo mais longe: no final de 2012 defendeu que Tony Blair e George W. Bush fossem levados diante do Tribunal Penal Internacional de Haia por terem mentido sobre a existência de armas de destruição maciça. Tutu argumentou que o número de vítimas provocado pela invasão e a guerra que se seguiu são mais que suficientes para que Blair e Bush sejam julgados no TPI.

David Miliband, ex-secretário dos Negócios Estrangeiros e deputado trabalhista, irmão do atual líder do Labour, é da opinião que “a pior coisa que aconteceu a Tony Blair foi a eleição de George W. Bush, pela direção em que este levou o mundo”. O problema é que Blair chegou a argumentar que a sua proximidade a Bush lhe tinha permitido influenciar as decisões, mas a verdade é que todas as testemunhas dos bastidores da invasão agora confirmam que Blair limitou-se a dizer que qualquer que fosse a decisão de Bush, o Reino Unido apoiá-la-ia.

Blair não reconhece que o seguidismo em relação a Bush foi um erro, mas não é acompanhado pelos que lhe estavam próximos na altura. No início de março deste ano, John Prescott, que era o vice-primeiro-ministro de Blair, disse que a guerra que ele próprio apoiou “não pode ser justificada”. Prescott disse que tentou justificar a decisão, mas não conseguiu: “Não pode ser justificada como intervenção”, reconheceu.

Fim de linha em 2007

A invasão do Iraque foi o início do fim da carreira de Blair. O primeiro-ministro britânico ganharia ainda as eleições de maio de 2005, mas a maioria trabalhista de 160 deputados reduziu-se para 66. Em 27 de junho de 2007, Blair renunciou ao cargo e também ao mandato de deputado. Logo depois, foi confirmado como enviado da ONU ao Médio Oriente anunciando um novo plano de paz para a região, que nunca saiu do papel. A dedicação de Blair ao novo cargo também não foi melhor. Exemplo disso foi que nos primeiros nove dias da invasão de Israel a Gaza, o ex-primeiro-ministro manteve-se totalmente alheio, tendo porém sido visto na inauguração de uma loja Armani em Knightsbridge. Assessores de Blair disseram depois que ele se mantivera em contacto telefônico com líderes mundiais desde o início do conflito.

Fortuna pessoal

Calcula-se que a fortuna pessoal de Blair seja de 60 milhões de libras, a maioria acumulada depois que chegou ao cargo de primeiro-ministro. Em janeiro de 2008, o ex-líder trabalhista foi contratado como conselheiro do banco de investimentos JPMorgan Chase e como conselheiro para questões relacionadas às alterações climáticas do Zurich Financial Services. Além disso, Blair cobra 250 mil dólares por uma palestra de 90 minutos. Em julho de 2010 foi revelado que os seus guarda-costas custam às finanças públicas britânicas 250 mil libras ao ano.

Bush entrou no ranking dos piores presidentes dos EUA

Quando terminou o seu mandato na Presidência dos Estados Unidos, em janeiro de 2009, George W. Bush voou para o Texas e desde então tem vivido discretamente numa casa em Preston Hollow, nos arredores de Dallas.

As aparições públicas têm sido raras: participação via vídeo no programa de TV Colbert Report, ao funeral do senador Ted Kennedy, intervenções em seminários de Motivação, participação, a pedido de Obama e junto com Bill Clinton, num fundo para ajudar o Haiti. Em 2010, admitiu ter autorizado o uso de técnicas de tortura como o afogamento e afirmou que voltaria a fazê-lo “se fosse para salvar vidas”.

Em fevereiro de 2011, desistiu de uma visita que pretendia fazer à Suíça, temendo as ameaças de protestos durante um discurso que pretendia fazer em Genebra e sobretudo temendo a possibilidade de ser detido por ter autorizado o uso de tortura, violando as convenções internacionais sobre essa prática.

No outono de 2012, a revista ‘New York’ revelou que o ex-presidente descobrira recentemente a vocação da pintura, e que pintara dois autorretratos tomando banho e no chuveiro. Mais tarde, revelou-se que tinha cerca de 50 retratos de cães.

A rede de TV a cabo C-SPAN realizou em 2000 e atualizou em 2009 um ranking dos presidentes da República dos Estados Unidos, que colocou George W. Bush entre os piores presidentes da história do país, junto com Warren G. Harding, Andrew Johnson, Franklin Pierce e James Buchanan.

Duas mentiras derrotaram Aznar

Em dezembro de 2008, o ex-presidente do governo de Espanha, José María Aznar, reconheceu que não havia armas de destruição maciça no Iraque. “O mundo inteiro pensava que havia armas de destruição maciça e não havia, sei-o agora”, disse Aznar num ciclo de conferências. “Quando eu não sabia, ninguém sabia”, justificou.

Um ano antes já tinha dito que não se arrependia de ter envolvido o seu país na guerra do Iraque, porque foi “um dos momentos mais influentes da história do país”. “Nunca me vou arrepender de a Espanha ter vivido um dos momentos mais influentes da sua história e não me arrependo disso. Arrepender-me-ia de não ter estado à altura das circunstâncias”, disse, defendendo que era fundamental estar “ao lado dos aliados mais fortes possível”.

Nova mentira

Em março de 2004, o PP de Aznar perdeu as eleições depois de o chefe do governo atribuir à ETA a responsabilidade dos atentados que provocaram a morte de 191 pessoas e mais de 1.500 feridos. Muitos cidadãos consideraram que o governo mentia acerca da autoria do atentado para que não se considerasse que este era uma represália da Al-Qaeda pelo envio de tropas espanholas para o Iraque. Assim, duas mentiras – as armas de destruição maciça e a atribuição à ETA da responsabilidade do 11-M – selaram o futuro de Aznar.

Ecologismo é o novo comunismo”

Derrotado nas eleições, Aznar foi presidir a Fundación para el Análisis y los Estudios Sociales (FAES), foi nomeado presidente de honra do PP e tornou-se membro do Conselho de Estado. Em junho de 2006, o ex-chefe do governo espanhol foi nomeado para o Conselho de Administração do grupo News Corporation, de Rupert Murdoch, que lhe paga 220 mil dólares anuais pelo cargo.

Aznar foi também nomeado presidente para a América Latina da J.E. Robert, empresa dedicada a grandes operações imobiliárias nos Estados Unidos e na Europa e também entrou no Comité Assessor da Centaurus Capital, uma empresa de capital de risco especializada em hedge funds, cargo que abandonaria em 2009.

As suas intervenções políticas posteriores foram marcadas fortemente pelo conservadorismo. Em outubro de 2008, por exemplo, afirmou que o ecologismo é o novo comunismo, mostrando-se cético em relação aos perigos das alterações climáticas.

Barroso disse que foi enganado

Em novembro de 2007, numa entrevista à TSF e ao Diário de Notícias, Durão Barroso afirmou que na Cimeira dos Açores foi enganado: “Houve informações que me foram dadas, a mim e a outros, que não corresponderam à verdade. Tive documentos na minha frente dizendo que o Iraque tinha armas de destruição maciça. Isso não correspondeu à verdade”, disse.

Ainda assim, Barroso defendeu que Portugal nada tinha a lamentar sobre o papel que assumiu, e a prova disso seria a sua própria situação. “Portugal, ao dizer que sim ao seu aliado norte-americano, não perdeu espaço com isso, nem tem que estar arrependido. Eu fui, depois dessas decisões, convidado a ser Presidente da Comissão Europeia, e tive o consenso de todos os países europeus.”

A 29 de junho de 2004, Barroso anunciou a sua demissão da chefia do governo português, para assumir o cargo de 12º presidente da Comissão Europeia, sucedendo neste cargo a Romano Prodi. Foi substituído no governo por Pedro Santana Lopes, mas, passados poucos meses, o presidente Jorge Sampaio dissolveu a Assembleia da República e convocou eleições antecipadas, vencidas por José Sócrates.

Em 2011, o ex-presidente francês Jacques Chirac publicou um segundo volume das suas memórias, “Le temps présidentiel”, onde criticou Durão Barroso pela sua posição pró-americana na guerra no Iraque, afirmando que avisou diversas vezes, pessoalmente, tanto Bush como os seus aliados, das consequências negativas da guerra e da decisão de atacar o Iraque sem mandato das Nações Unidas.

Retirado do site da Agência Carta Maior.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

A MÍDIA DE BRAÇOS DADOS COM A DITADURA

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Por Alexandre Haubrich

A relação das elites civis com os ditadores militares foi íntima desde o começo da ditadura brasileira. O Golpe de 1964 foi amplamente apoiado por diversos setores da sociedade civil – a Marcha da Família com Deus pela Liberdade é um bom exemplo –, incluindo os principais jornais do país, que, no dia da derrubada do governo popular – reformista – de João Goulart, estamparam manchetes que celebravam o fim do “perigo comunista” e a reação dos militares.

Nos primeiros dias de abril de 1964, O Globo, Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil, Estado de Minas e muitos outros jornalões publicaram manchetes como “São Paulo parou ontem para defender o regime” (Folha de S. Paulo) e “Fugiu Goulart e a democracia está sendo restabelecida” (O Globo), “Só há uma coisa a dizer a Goulart: saia!” (Correio da Manhã), “Democratas dominam toda a nação” (Estado de S. Paulo), “Lacerda anuncia volta do país à democracia” (Correio da Manhã), “Multidões em júbilo na Praça da Liberdade” (Estado de Minas). “Heroísmo”, “democracia”, “glória”, “patriotas” e “bravura” foram algumas formas pelas quais os primeiros movimentos dos militares golpistas foram referidos.

Durante os 20 anos de trevas, de censura e de gritos sufocados – sim, porque haviam muitos que gritavam – o apoio continuou. Grandes empresários de todos os ramos deram sustentação financeira, social e político aos militares que se abancaram no poder, e os barões da mídia não tiveram atitude diferente. Os episódios de uso de carros da Folha de S. Paulo por agentes da Ditadura e da mentira da TV Globo na cobertura do comício das Diretas Já são exemplos gritantes do que acontecia em silêncio cotidianamente: a colaboração entre militares e empresários da comunicação.

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Enquanto isso, jornalistas eram calados pelo governo e pelos patrões, e buscavam formas de contornar a censura. Dentro das próprias grandes redações o jornalismo intelectual e comprometido com o leitor – substituído hoje pelo jornalismo de tarefas comprometido com a empresa – era uma realidade. O patrão andava de braços dados com os generais, mas os jornalistas cuspiam na cara da ditadura. Porém, de formas diferentes – às vezes a censura, às vezes a tortura, outras vezes o assassinato – muitos acabaram pagando por desejarem liberdade.

Paralelamente, a mídia independente tornava-se imprescindível, e ganhava corpo, com o nascimento e a ascensão de veículos como O Pasquim – de Tarso de Castro –, o Coojornal – mais importante iniciativa de jornalismo formalmente cooperado na história brasileira – e O Movimento. Com personagens, ideários e condutas variadas, a imprensa alternativa – especialmente nos anos 70 – teve um caminho comum: o combate à ditadura.

Em 2008, quando o governo federal trouxe à tona o debate sobre a abertura dos arquivos da Ditadura Militar, boa parte da imprensa dominante brasileira alinhou-se aos militares de pijama e aos mais diversos setores da direita brasileira para dizer que se tratava de revanchismo. A gritaria foi tanta, fortalecida pelo discurso conservador da grande mídia, que os setores mais combativos do governo arrefeceram. A revisão da Lei da Anistia não saiu, os arquivos da Ditadura continuaram fechados, todos nós continuamos cegos, surdos e mudos, continuamos ignorantes, o conhecimento sobre o passado brasileiro está logo ali, mas ninguém pode tocá-lo. Index Librorum Prohibitorum.

A cada vez que esse debate ganha corpo, ou a velha mídia brasileira se esquiva ou fala em revanchismo para descaracterizar a simples e óbvia luta pela verdade e pela punição de criminosos do mais alto grau. As razões também são simples e óbvias: além do suporte dado por alguns desses veículos aos militares e seus aliados civis, também muitos atuais patrocinadores da grande mídia injetaram muito dinheiro para manter o regime ditatorial no Brasil. E também lucraram com isso. Ainda temos atuantes na cena política muitos nomes que colaboraram direta ou indiretamente para reprimir violentamente qualquer voz dissonante ao Regime, para torturar e assassinar uma grande quantidade de pessoas dos mais diversos tipos. No exército, na política institucional, no alto empresariado e na mídia, torturadores, assassinos e cúmplices destes crimes ainda têm seus lugares cativos.

Também questões factuais ligadas ao tema da Ditadura Militar são omitidas ou desviadas constantemente: os julgamentos dos assassinos militares argentinos e as discussões sobre o tema no Uruguai não são relacionados com o caso brasileiro. Ícones da repressão, como o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, têm artigos publicados nos nossos jornais. Um ex agente do DOPS processando um jornalista não é notícia. Jornalão chama ditadura brasileira de “Ditabranda”.

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A revisão da Lei da Anistia e a abertura de todos os arquivos da Ditadura Militar são ações essenciais se quisermos construir uma sociedade democrática. O silêncio e a impunidade alimentam a corrupção, o autoritarismo, a violência policial e outras mazelas presentes desde sempre na sociedade brasileira, mas tornadas rotineiras, quase moralizadas, no período ditatorial.

Conhecer nossas origens é fundamental para que nos reconheçamos como sujeitos da História. Conhecer as origens da nossa sociedade é pressuposto para entendermos quem somos. Todos temos o absoluto direito à verdade. Negar esse direito ou não punir quem o negou é ser, também, um braço ainda vivo da Ditadura.

Cabe aos comunicadores alternativos gritarem ainda mais alto em defesa do verdadeiro fim da Ditadura. A sociedade organizada e a mídia contra-hegemônica têm obrigação moral de encampar essa pauta em defesa da verdade e da história brasileira. É a defesa da sociedade, a defesa de quem lutou das mais diversas formas pelo fim da ditadura, a defesa do passado e do futuro. Bastião teórico da liberdade e da transparência, a velha mídia apoiou a Ditadura Militar e agora tenta impor-se como barreira à verdade histórica que o povo brasileiro tem direito de conhecer: sua própria história. Isso só acontecerá quando enterrarmos nossos mortos e deixarmos de admitir a tortura, a opressão estatal, a violência policial e os assassinatos cometidos pelo Estado – ontem e hoje. A mobilização nos blogs e nas redes sociais tem sido significativas, e o governo, em algum momento, terá que dar resposta aos apelos da sociedade organizada que pretende representar, ou se tornará dispensável.  Precisamos recusar o cumprimento da Ditadura, ou nossas mãos continuarão sendo esmagadas pelos braços unidos de ditadores e empresários da comunicação.