sábado, 30 de março de 2013

Criança, a alma do negócio - Link para Download

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Por que meu filho sempre me pede um brinquedo novo? Por que minha filha quer mais uma boneca se ela já tem uma caixa cheia de bonecas? Por que meu filho acha que precisa de mais um tênis? Por que eu comprei maquiagem para minha filha se ela só tem cinco anos? Por que meu filho sofre tanto se ele não tem o último modelo de um celular? Por que eu não consigo dizer não? Ele pede, eu compro e mesmo assim meu filho sempre quer mais. De onde vem este desejo constante de consumo?

Este documentário reflete sobre estas questões e mostra como no Brasil a criança se tornou a alma do negócio para a publicidade. A indústria descobriu que é mais fácil convencer uma criança do que um adulto, então, as crianças são bombardeadas por propagandas que estimulam o consumo e que falam diretamente com elas. O resultado disso é devastador: crianças que, aos cinco anos, já vão à escola totalmente maquiadas e deixaram de brincar de correr por causa de seus saltos altos; que sabem as marcas de todos os celulares mas não sabem o que é uma minhoca; que reconhecem as marcas de todos os salgadinhos mas não sabem os nomes de frutas e legumes. Num jogo desigual e desumano, os anunciantes ficam com o lucro enquanto as crianças arcam com o prejuízo de sua infância encurtada. Contundente, ousado e real este documentário escancara a perplexidade deste cenário, convidando você a refletir sobre seu papel dentro dele e sobre o futuro da infância.


Ficha Técnica:

49 min - Documentário Direção: Estela Renner País: Brasil Ano de lançamento: 2008

Link para Download via torrent: Criança, a alma do negócio

Para assistir online:

sexta-feira, 29 de março de 2013

Coreia do Norte prepara mísseis para eventual ataque aos EUA

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O líder norte-coreano, Kim Jong-un, ordenou nesta sexta-feira 29 o início dos preparativos para atacar com mísseis o território dos Estados Unidos e suas bases no Pacífico e na Coreia do Sul, indicou o órgão oficial do regime norte-coreano, a agência KCNA.

A ordem foi emitida durante uma reunião de emergência noturna com os líderes de alto escalão do exército, indicou a KCNA, e é uma resposta direta às manobras conjuntas dos Estados Unidos e da Coreia do Sul na península com bombardeiros furtivos americanos B-2, capazes de transportar armas nucleares.

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Em caso de provocação imprudente dos Estados Unidos, as forças norte-coreanas “deverão atacar sem piedade o (território) continental americano (…), as bases militares do Pacífico, incluindo Havaí e Guam, e as que se encontram na Coreia do Sul”, declarou Kim, citado pela agência oficial.

Na quinta-feira, em um contexto de escalada de tensões entre as duas Coreias, dois bombardeiros furtivos B-2 sobrevoaram a Coreia do Sul, uma maneira de os Estados Unidos ressaltarem sua aliança militar com Seul em caso de agressão do Norte.

 

Segundo a agência oficial, Kim Jong-un disse que o voo dos bombardeiros furtivos equivale a um “ultimato e demonstra que querem lançar a qualquer preço uma guerra nuclear”.

O chefe do Estado-Maior do Exército Popular da Coreia, o diretor de operações e o comandante de operações estratégicas e foguetes estiveram presentes na reunião de emergência, realizada nesta sexta-feira às 00h30 locais (12h30 de quinta-feira no horário de Brasília), segundo a KCNA.

Washington não costuma anunciar os voos de treinamento do B-2, um avião projetado para entrar nas linhas inimigas e bombardear alvos estratégicos a partir de uma grande altitude (até 15.000 metros).

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Considerado indetectável e capaz de voar perto da velocidade do som, o B-2 pode transportar até 18 toneladas de armas convencionais ou nucleares, incluindo 16 bombas de 900 kg guiadas por satélite e oito bombas GBU-37 antibunker.
 
A Coreia do Norte já havia ameaçado na terça-feira os Estados Unidos com ataques contra seu território e suas bases no Pacífico, mas se tratava de um anúncio, também através da agência oficial, proveniente do Exército. Neste caso trata-se de um alerta do líder do regime.

A China pediu nesta sexta-feira às partes interessadas “que façam esforços coletivos para resolver a situação”. “A paz e a estabilidade na península coreana são benéficas para todos”, declarou o porta-voz do ministério das Relações Exteriores chinês, Hong Lei.


A China é o único aliado da Coreia do Norte e seu principal sócio comercial, que lhe fornece recursos energéticos indispensáveis para sua economia.

Na quinta-feira, Washington disse mais uma vez estar “preparado para enfrentar qualquer eventualidade” procedente da Coreia do Norte, indicou o secretário de Defesa americano, Chuck Hagel.

Os especialistas militares americanos afirmam, no entanto, que até o momento o aumento da retórica belicista da Coreia do Norte não é acompanhado por ações militares.

Pyongyang, por exemplo, evitou ao máximo as tensões em torno das instalações industriais de Kaesong, compartilhadas com a Coreia do Sul, e que fornecem ao Norte receitas vitais para sua economia.

Desde o início de março e a adoção de novas sanções da ONU contra Pyongyang, depois de um terceiro teste nuclear, a Coreia do Norte aumentou o tom de suas declarações, ameaçando Seul e Washington com ataques estratégicos e com uma guerra total.

“Mas isso não deve ser interpretado como sinal de uma guerra iminente”, disse Kim Yong-hyun, um especialista sul-coreano da Universidade Dongguk. “É uma reação esperada e calibrada pela mobilização de B-2, e este jogo com os Estados Unidos vai prosseguir”, acrescentou.



Fonte: Carta Capital

quinta-feira, 28 de março de 2013

Eduardo Paes molecular ou Por outro norte da cidade!

O Governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes em momento descontraído



Por Bruno Cava, blogueiro e militante da UniNômade

Em 1º de março, apesar da greve dos rodoviários e do feriado da cidade, vários coletivos estiveram presentes no campus da Praia Vermelha da UFRJ, no Rio. Chamada pelo coletivo Norte Comum e pela rede Universidade Nômade, a reunião contou com participantes dos grupos Favela não se Cala, Justiça Global, Fórum Cidades Invisíveis, i-Motirõ, Centro de Teatro do Oprimido, Cursinhos Pré-Vestibulares para Negros e Carentes, Movimento Unido dos Camelôs, mandatos dos vereadores Renato Cinco e Reimont Otoni, ex-defensores e estagiários do Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública, entre outros. A tônica do encontro foi começar uma conversa e delinear coordenadas políticas para a atuação conjunta, nos moldes de um fórum transversal ou agregado de grupos autônomos, cujo primeiro evento se pretende realizar na zona norte da cidade, em abril ou maio. Os mandatos de luta no Rio de Janeiro estão convidados a participar, interessados em se deixar atravessar pelas mobilizações e movimentos.

Com a reeleição de Eduardo Paes, numa coalizão que engole a facção carioca do PT, o momento é de reorganização da pauta de movimentos e coletivos. Ante o esgotamento da esquerda mais tradicional nos partidos, repensar a organização dos movimentos e transformações que já existem e já exercem seus efeitos de resistência pela cidade. Vive-se no Rio um momento de perplexidade, em que ações francamente intoleráveis são justificadas a título de “interesse coletivo” ou até “socialismo” (o exemplo máximo disso foi o discurso do ex-secretário de habitação Jorge Bittar).

O poder constituído perdeu o pudor, oficializando políticas de higienização, gentrificação e acumulação dos ganhos. O modo “Banco Imobiliário” de governar se tornou abertamente discurso oficial. A cidade-empresa e a cidade-jazida continuam a ser construídas diariamente mediante operações e ações policiais de “choque de ordem”, “pacificação” e “remoção democrática”. Sem falar na remoção branca, que vai removendo escalonadamente os cidadãos a bairros mais distantes das praias, por causa da supervalorização dos aluguéis e aumento do custo de vida dos bairros “pacificados” e “glamourizados”.

Como comentou um militante do movimento Favela Não se Cala, o desafio agora é lutar no terreno da “pós-pacificação”. No momento em que as UPP se estabilizaram e até voltaram a negociar com antigos grupos de poder e violência que monopolizavam os territórios dos pobres. Momento também de enraizamento das redes de governança, com a formalização dos serviços e a exploração direta por meio da milícia — exemplo máximo da hibridação entre estado e mercado do capitalismo.

Quem olha a televisão, lê os jornalões ou analisa as estatísticas, não pode deixar de ter a impressão de que o Rio vive uma tempo maravilhoso. A cidade, finalmente, teria se redimido da perda do status de capital federal, deixando para trás 50 anos de um noticiário recheado de insegurança, corrupção e decadência. Vive-se o discurso do novo Rio, novamente elegante, terra de gente bonita e cartão-postal do Brasil Maior. O Rio é o portão de entrada para um país formado pela “nova classe média”, e uma nova safra de governantes-executivos, aliados a um empresariado empreendedor, um funcionalismo público renovado e uma creative class da classe-média branca e ilustrada, cujo símbolo máximo (e desavergonhado) é o recém-inaugurado Museu de Arte do Rio (MAR).

Como o governo Eduardo Paes (PMDB/PT) conseguiu construir tamanho consenso, representado em cores tão ufanistas pelas mídias “oficiais”? A ponto de obter 65, 70 ou até 80% dos votos em bairros pobres da cidade? Onde está o efeito de escala desse governo, sua lógica molecular, seu funcionamento concreto? Porque os velhos aparelhos de violência estatal, racismo e medo persistem.

Uma resposta rápida aponta para o esgotamento da própria política. A cidade, ainda que tradicionalmente insubmissa, estaria desmobilizada. Num cenário nacional de crescimento econômico e novas oportunidades, as pessoas estariam mais preocupadas em adaptar-se, ganhar dinheiro, “subir na vida”, do que na mobilização política. Esse argumento conduz invariavelmente à ideia que Eduardo Paes foi eleito no primeiro turno graças à desmobilização ou “alienação”. As pessoas votaram porque estão mal-informadas. Um argumento próximo da velha (e reacionária) tese do clientelismo populista (de Sérgio Buarque de Hollanda a Roberto DaMatta), em que os mais pobres, despidos de profunda espiritualidade, votariam guiados pelo estômago, — em vez de usar a sóbria e desinteressada razão em prol do interesse geral, qualidade exclusiva da classe média branca e ilustrada.

É a mesma tese disfarçada pela esquerda quando argumenta que falta “consciência de classe”, e que portanto o voto em Freixo ou no PSOL se concentraria mais na Zona Sul devido ao maior número de pessoas conscientes e interessadas na política. Isto é, noutros termos, devido à existência de uma forte classe média branca e ilustrada.

Outra resposta consiste em apontar a falência da democracia representativa, que desce aliás ao âmago do próprio conceito de representação, e que inclusive justificaria a proporção crescente de abstenções e votos nulos. Muitas pessoas estão desencantadas com as opções disponíveis no mercado eleitoral. Em vez de “alienadas” ou desmobilizadas, tem-se aí um ato de recusa. Dirigem seus esforços para outro lugar, porque desse mato não sai cachorro. Esse discurso repercute a tendência que vem das resistências no hemisfério norte: 15M, #nolesvote, movimento Occupy; ou nem tão do norte assim: que se vayan todos!, slogan argentino de 2001.

Paradoxalmente, o discurso mais abertamente antirrepresentativo encontra um ponto de toque com forças à direita que se apresentam como “apartidárias”, e mesmo acima de uma política pautada pela luta de classe. Esse estranho ponto de encontro se dá ao redor do discurso do vazio da política. Quer dizer, viveríamos a era do vazio da política, a debaclê das ideologias. Os âmbitos e instituições tradicionalmente perpassadas pela política estariam “despolitizadas”, corrompidas pelo interesse privado erigido à razão pública. No Brasil, um realinhamento eleitoral teria levado as forças partidárias a achatar-se essencialmente nas mesmas pautas e modos de existir, reduzindo a quase zero a diferença entre os programas.

Esse discurso, em tons indignados ou melancólicos, discurso de “fim da história”, ainda que seja à esquerda, costuma distribuir a culpa pela situação às próprias pessoas, além de criticar a corrupção do estado (e não o estado como a corrupção). As pessoas — e aqui existe um corte de classe — estariam “despolitizadas” ou “alienadas”, seduzidas pelo consumismo e a ilusão de ascensão social, domesticadas e imbecilizadas pela comunicação de massa. Trazida para a realidade carioca, essa linha de interpretação teima em culpar as pessoas, especialmente a maioria pobre, pela reeleição de Eduardo Paes em 2012. Não sabem o que fazem, ao votar em Paes.

Em artigo de avaliação do último pleito, Alexandre Mendes, da UniNômade, mostrou que o resultado não admite conclusões tão apressadas.

Nessa linha que assume o “vazio da política”, sua corrupção ou sua obsolescência, têm aparecido frentes que se propõem a renovar a política. A reinventá-la noutras formas, com novas maneiras de organizar a militância e novas concepções de representação e expressão. A ênfase no “novo” é fundamental. Daí, se reorganizaram alguns grupos existentes para lançar projetos com o apelo da novidade, tais como a Rede de Marina Silva, o Partido do Futuro, na Espanha (elogiado por Manuel Castells) e o 5Stelle encabeçado por Beppe Grillo, na Itália. Em comum, esses grupos canalizam uma insatisfação difusa com a política-que-está-aí e evitam se definir segundo o espectro clássico entre esquerda e direita. Isto significa, em parte, uma recusa em entrar nos esquemas do velho, para reforçar que, no mundo do século 21, é preciso reinventar a própria definição do que seja posicionamento político.

Isto traz várias complicações e armadilhas. Na resposta do “vazio da política”, os grupos parecem atribuir-se a responsabilidade histórica, quase missionária, de preencher-lhe. Se a política é velha e a militância ultrapassada, eles se põem no cenário como os arautos de uma nova política e um  ativismo mais “contemporâneo”, onde não haveria lugar, por exemplo, para os fantasmas da “luta de classe” ou do “comunismo”. Menos que uma recusa às utopias do século 20, tem-se aí uma recusa do próprio antagonismo como motor da história. São teóricos e ativistas “elevados”, acima dessa era rancorosa em que as pessoas lutavam com ódios ideológicos.

Os adjetivos “complicado” e “problemático” se aplicam perfeitamente a essas tendências, mas o destino político delas, guardada a reserva crítica, é preciso reconhecer ainda estar em aberto. Sem condescendência, mas também despojado de denúncia apriorística. Por sua vez, a rejeição do fetiche do novo não pode significar a apologia do velho, do espectro político-partidário existente, na quase totalidade engessado e capturado.

Outra possibilidade, talvez mais interessante, seja não cair nessa outra dicotomia que no lugar de opor esquerda e direita, opõe a novidade ao obsoleto, em conotação teleológica onde o tom moral nunca está distante. Além dessa linha, talvez seja caso de não afirmar algum “vazio da política”. Os pobres não estão despolitizados. Sua mobilização já acontece, só não conseguimos enxergá-la. A leitora de Foucault sabe que não existe vazio de poder. A política nunca dorme. O que sucede amiúde entre os meios de esquerda é não enxergar as coordenadas e os planos de composição em que essa política acontece. Falta generosidade no olhar e na construção das relações. E falta pesquisa militante junto de movimentos e forças vivas do trabalho, na conexão entre política e produção, entre luta e trabalho, o que os operaístas italianos chamariam de “composição de classe”.

Nesse sentido, volta a pergunta, onde está a política que reconduz Eduardo Paes à prefeitura com mais de 60% dos votos válidos, chegando a 70, 75 ou mesmo 80% nos bairros pobres? Quais são as formas, os métodos, as conexões político-produtivas que determinam os consensos de governança carioca? Como se fabrica um consenso que não tem qualquer vergonha em triturar pobres e negros, sob o aplauso unânime da grande imprensa? Em explorar o desenvolvimento da cidade e dirigi-lo abertamente à ainda mais desigualdade territorial e social, racismo e concentração dos ganhos? Denunciar o intolerável e a miséria do poder é fácil e até redundante. Difícil é explicar porque acontece. Interpretar para transformar. Explicar para se implicar melhor na constituição política do presente, e desse plano de composição tirar as linhas de corte, fuga e recomposição de classe.

O “preenchimento” talvez esteja acontecendo em múltiplos níveis, transescalarmente pelos muitos territórios, bairros e zonas do Rio de Janeiro. Dê-se por redes enraizadas que conseguem mobilizar, de uma maneira ou de outra, a força produtiva dos pobres. Isso passa por uma cauda longa de operadores estrategicamente posicionados, mais ou menos conscientes de sua posição na governança da cidade, dentro ou fora do “estado oficial”.

Agentes, articuladores, animadores em distintos graus de envolvimento com obras públicas, instituições locais, órgãos da prefeitura, redes varejistas, de comércio informal, esportes, cultura, políticas sociais, transporte público, equipamentos urbanos culturais, instâncias de controle territorial, lideranças comunitárias, igrejas, associações de moradores, milícia, tráfico, lavagem de dinheiro e longo etcétera — a equação é complexa. É a cidade policêntrica e sua rede que articula verticalidades e horizontalidades cujas
fronteiras são difíceis de precisar, mutantes, maleáveis. Tudo isso é também Eduardo Paes. Um Eduardo Paes molecular. Ou melhor, uma base material capilarizada sobre o que a governabilidade pôde construir e sustentar algo como o governo Eduardo Paes.

Nesse sentido, não basta denunciar um governo que sustenta o Grande Negócio (imobiliário, empreiteiro, midiático-esportivo, telefonia, transportes, lixo, bem como as finanças que estão em tudo) por baixo da violência e do intolerável cotidianos. Mas compreendê-los como produto de fluxos de poder, dos escoamentos de dinheiro e da colonização da subjetividade, fenômenos que se espraiam pela metrópole. A violência racista contra pobre deriva dessa estrutura produtiva. Uma estrutura que, na outra ponta, produz uma sensação, uma estética e um discurso de sustentação onde as pessoas podem se segurar e ser de alguma forma produtivas, produtivas como não eram, e a partir daí construir o seu futuro, e comprazer-se com a percepção, ainda que incipiente, de toda sorte reconfortante e motivadora, que podem “subir na vida”. O caso é compreender como o enunciado “subir na vida” está imbricado com uma ética do trabalho, o que envolve as igrejas neopentecostais, a televisão, a publicidade, mas também arranjos familiares e algum cooperativismo local.

Em vez de simplesmente condenar esse “subir na vida”, que mais do que ilusão é um fato vivido e sentido na pele pelos pobres, perceber como por dentro disso também há elementos produtivos, essencialmente políticos, ligados a um aumento de demandas, expectativas, e mesmo uma autopercepção de capacidades que, até pouco tempo atrás, não havia. Essa autopercepção é reapropriável como luta. A mobilização produtiva dos pobres, em grande escala, — algo muito menos perceptível há 15 ou 20 anos no Rio de Janeiro, — já implica formas de “consciência de classe” e uma politização que muitas vezes passa despercebida segundo os esquemas da esquerda brasileira. Condenar o “subir na vida” tem sido o diagnóstico geral, como se a classe média — extrato social mediador e legitimador de qualquer época capitalista — não se organizasse subjetivamente ao redor disso.

O verdadeiro problema talvez consista em entender como esse mesmo “subir na vida” termine apropriado para sustentar a governança desigual da cidade, atuando no sentido de manter a pirâmide do Grande Negócio e seus poucos e grandes proprietários. Sem condenar quem enuncia querer “subir na vida”, mas lhe distinguir os vários polos internos do enunciado, cujo sentido, ao fim e ao cabo, está em disputa. É a própria disputa no plano da subjetividade. Nem amor ad lazarus à moda narodnik, nem racismo de classe à direita ou à esquerda.

O caso possivelmente seja compreender, igualmente, como as políticas sociais e culturais — ainda modestas, mas não desprezíveis — aprofundadas com o governo Lula, também entram como dupla variável da equação. Dupla variável, pois mobiliza produtivamente (logo, politicamente), ao mesmpo tempo em que explora essa mobilização. Acontece com duplo polo: apropriação pelo poder, reapropriação pela “consciência de classe”, ou melhor, pela organização de redes territoriais. E tentar fazer um esforço interpretativo para entender como essas políticas podem ser (e no fundo já estão) tensionadas para a reapropriação das estruturas e mediações com que funciona o governo Eduardo Paes, e também o estadual e o federal — no sentido, por exemplo, da renda universal incondicionada, ou de conselhos territoriais articulados além da lógica militarizada e “pacificadora”.

Não é caso, de todo jeito, de simplesmente denunciar os aspectos negativos e tendencialmente de fechamento das políticas sociais e culturais, nem do “subir na vida” na base da produção de subjetividade que igrejas, governos e máfias também colonizam. Essa é uma tarefa fácil e, no final das contas, inútil. O trabalho exclusivo do negativo serve, no máximo, para alimentar o ciclo 7-24 das redes sociais, num transe de indignação e denúncia com soma final zero. A negatividade só exerce poder apoiada sobre uma positividade maior e mais interessante no presente.

O que fazer, então, não terá resposta num artigo ou numa reunião. Depende da copesquisa das coordenadas e condições dessa produção além das mediações e estruturas. Uma copesquisa que as redes de resistência-produção já fazem no dia a dia, ainda que de forma pouco integrada. O que fazer — a pergunta leninista que sempre volta — implica situar-se dentro da franja de subjetividade, e ver e enxergar e vivenciar como fugir das armadilhas, dos polos negativos das equações, e contribuir para vazar o excedente de luta, indignação e insatisfação implicado nas subjetividades. Esse trabalho não prescinde de uma análise da representação, das eleições, das instituições estatais, embora seja fundamental não se render ao estado como ponto de vista (mantendo todavia um ponto de vista sobre o estado).

Esse desafio para interpretar e transformar a constituição política do presente não passa por postular vazios para se oferecer como mais pleno. O salvacionismo dos pures et dures simplesmente esbarra na realidade, que não funciona segundo a lógica velho x novo, puro x impuro, verdade x mentira, limpo x corrupto. É preciso reconhecer que os espaços e tempos estão inteiramente preenchidos, que a política esteja pulsando por todos os lados, para um lado e para o outro, e que portanto seja preciso ocupar esses espaços-tempos. Posicionar-se na mobilização produtiva e, sem negá-la com ranços, derivar seus sentidos. Ocupá-los não para simplesmente disputar espaço, mas para transformá-lo, revolucionando a própria distribuição desigual dos espaços e tempos da cidade.

É um desafio de reapropriação da cidade desde baixo, desde as bases materiais de sua produção de vida e morte, desde as forças e os corpos que fazem o Rio de Janeiro. Um trabalho de remobilização que não prescinde de uma política forte da composição, para agregar e multiplicar os sentidos e afetos do outro Rio, do outro Rio que já subsiste nas entrelinhas deste. A nova política não é propriamente nova, mas sim recomposta. O trabalho da multidão está em copesquisar e recompor essa outra cidade,  linda e insubmissa, tanto vexada nos últimos tempos com a governança vigente, suas alianças mafiosas e suas redes de saqueio.


quarta-feira, 27 de março de 2013

As entranhas do declínio americano


Joseph Sitglitz explica: por que desigualdade, redução do Estado e rentismo financeiro produzem, além de injustiça, cada vez mais ineficiência
  
Por Joseph Stiglitz, em Vanity Fair | Tradução: Gabriela Leite

Vamos começar estabelecendo uma premissa básica: a desigualdade nos Estados Unidos aumenta há décadas. Todos estamos conscientes deste fato. Certas vozes na direita negam a realidade, mas analistas sérios, em todo o espectro político, reconhecem o fenômeno. Não vou elencar todas as evidências neste texto: basta lembrar que a diferença entre o 1% e os 99% é muito vasta quando a analisamos em termos de rendimento anual; e ainda maior quando observamos a riqueza — ou seja, o capital acumulado e outros bens. Considere a família Walton: os seis herdeiros do império do Walmart possuem uma riqueza combinada de cerca de 90 bilhões de dólares, o que é equivalente à riqueza somada dos 30% mais pobres, entre os norte-americanos (muitos deles possuem patrimônio líquido zero ou negativo, especialmente depois do colapso imobiliário). Warren Buffet [leia, de sua autoria, “Parem de mimar os super-ricos”] situou o tema de forma correta quando disse: “Houve uma guerra de classes nos últimos 20 anos, e minha classe ganhou.”
Portanto, o debate real não é sobre o fenômeno da desigualdade, mas sobre seu significado. À direita, ouve-se algumas vezes o argumento de que a desigualdade é basicamente uma coisa boa: se os ganhos dos ricos crescem, afirma-se, toda sociedade segue em seu vácuo. Este argumento é falso: enquanto os ricos têm ficado mais ricos, muitos norte-americanos (e não apenas os mais empobrecidos) não conseguem manter seu padrão de vida, muito menos avançar. Um trabalhador em tempo integral típico ganha hoje o mesmo salário que recebia três décadas atrás.

Entre a esquerda, por outro lado, o crescimento da desigualdade frequentemente provoca um apelo por justiça: por que tão poucos podem ter tanto, enquanto tantos têm tão pouco? Não é difícil entender por que, em uma era dirigida pelo mercado, na qual a própria justiça é em si uma mercadoria que pode ser vendida e comprada. Mas alguns rejeitariam o argumento, rotulando-o como coisa de sentimentais piedosos.
Mesmo colocando o sentimento à parte, existem boas razões para que os próprios plutocratas importem-se com a desigualdade — até mesmo por egoísmo. Os ricos não existem em um vácuo. Necessitam de uma sociedade que funcione em torno deles, para sustentar sua posição. A evidência histórica e do mundo moderno é inequívoca: vamos chegar a um ponto em que a desigualdade desencadeará disfunções econômicas que se espalham por toda a sociedade. Quando isso acontecer, até os ricos pagarão um grande preço.

Vamos examinar algumas razões.

O problema do consumo

Quando um grupo social concentra muito poder, torna-se capaz de assegurar políticas que beneficiam a si próprio, a curto prazo — ao invés de contribuir, a longo prazo, para a sociedade como um todo. Foi o que ocorreu nos EUA, no que diz respeito às políticas tributárias, regulatórias e de investimento público. As consequências (aumento dos rendimentos e da riqueza em favor de um único setor da sociedade) tornam-se visíveis quando se observam os gastos das famílias, um dos motores da economia norte-americana.

Não por acaso, os períodos em que setores mais amplos da sociedade norte-americana registraram aumento dos rendimentos líquidos — ou seja, quando a desigualdade foi reduzida, em parte graças a impostos progressivos — foram aqueles em que a economia cresceu mais rápido. Também não é por acaso que a atual recessão, assim como a Grande Depressão, foi precedida por grandes aumentos na desigualdade. Quando muito dinheiro é concentrado no topo da sociedade, os gastos do norte-americano médio tornam-se necessariamente menores — a menos que haja algum estímulo de outra natureza. A concentração do dinheiro reduz o consumo porque indivíduos de renda mais alta consomem uma fração muito menor de seus rendimentos, se comparados às pessoas de rendimentos mais baixos.

Aparentemente, não é assim. Os gastos dos ricos são extraordinários, como se constata admirando, nas páginas do Wall Street Journal de fim-de-semana, as fotografias coloridas dos anúncios imobiliários. Mas a realidade torna-se visível quando você faz a conta. Considere alguém como o candidato do Partido Republicano à Presidência, Mitt Romney, cujos rendimentos chegaram, em 2010, a 21,7 milhões de dólares. Mesmo se Romney optar por um estilo de vida muito mais perdulário, gastará apenas uma fração desse montante, em um ano típico, para manter a si mesmo e sua esposa, em suas diversas casas. Mas tome a mesma soma de dinheiro e divida por aproximadamente 500 pessoas — na forma, digamos, de empregos que paguem 43.400 dólares por ano — e você descobrirá que quase todo o dinheiro é gasto.

A relação é direta e obrigatória: quanto mais o dinheiro fica concentrado nas classes mais favorecidas, mais a demanda agregada declina. A não ser que “algo a mais” aconteça, na forma de intervenção, a demanda total será menor do que a economia é capaz de oferecer. Significa  que haverá um aumento no desemprego, o que vai enfraquecer a demanda ainda mais. Nos anos 1990, a bolha da tecnologia foi este “algo a mais”. Na primeira década do século 21, foi a vez da bolha imobiliária. Hoje, o único recurso, em meio a uma profunda recessão, são os gastos do governo — exatamente o que o pessoal no topo da pirâmide está tentando refrear.

O problema da caça de rendas

Aqui, preciso recorrer um pouco ao jargão econômico. A palavra renda foi originalmente usada, e ainda é, para descrever o que alguma pessoa recebe pelo uso da terra: é o retorno obtido simplesmente em virtude de propriedade, e não pelo fato de fazer ou produzir algo. Renda contrasta com salário, por exemplo, que conota uma compensação pelo trabalho fornecido pelos assalariados. O termo renda foi, depois, estendido para abranger os lucros de monopólio — a renda que alguém recebe simplesmente por controlar um monopólio. E por fim, o significado da palavra expandiu-se ainda mais, para incluir a remuneração de outros tipos de reivindicações de propriedade. Se o Estado concede a uma empresa o direito exclusivo de importar uma certa quantia de um certo bem (como o açúcar), então os ganhos oriundos deste monopólio são chamados de “renda da quota”.

A concessão de direitos de mineração ou extração de petróleo produz uma forma de renda. O mesmo ocorre com tratamento tributário preferencial, para certos lucros. Num sentido mais amplo, a caça de rendas [rent seeking] define muitas das maneiras por meio das quais nosso processo político favorece os ricos às custas de todos os demais. Inclui transferências e subsídios do governo, leis que tornam os mercados menos competitivos, leis que permitem aos executivos abocanhar uma fração desproporcional dos lucros das empresas e que permitem às corporações ampliar seus lucros destruindo a natureza.

Embora difícil de quantificar, a magnitude da “caça às rendas”, na economia norte-americana, é imensa. Indivíduos e empresas que se aprimoram nesta atividade são fartamente recompensadas. O setor financeiro — que hoje funciona em grande medida como um mercado de especulação, ao invés de uma ferramenta para promover produtividade econômica autêntica — é caçador de rendas por excelência. A prática não se limita à especulação. Este setor extrai rendas também de seu controle sobre os meios de pagamento — por exemplo, cobrando tarifas exorbitantes nas operações bancárias e cartões de crédito, ou imponto, aos vendedores, tarifas menos conhecidas, que são repassadas aos consumidores.

O dinheiro que o setor financeiro extrai dos norte-americanos pobres ou de classe média, por meio de práticas predatórias de crédito, pode ser visto como uma forma de renda de monopólio. Nos últimos anos, este setor apropriou-se de cerca de 40% de todo o lucro empresarial nos EUA, algo totalmente distante de sua contribuição social. A crise mostrou, ao contrário, como ele pode espalhar devastação pela economia. Numa sociedade de caça às rendas, como aquela em que os Estados Unidos se converteram, retorno financeiro e retribuição à sociedade estão perigosamente fora de sintonia.

Em sua forma mais simples, as rendas não são mais que transferências de riqueza, de uma parte da sociedade para os caçadores de renda. Muito da desigualdade em nossa economia resulta da caça de rendas, porque este processo extrai recursos da parte de baixo da pirâmide e os concentra no topo.
Mas há uma consequência econômica mais ampla: a luta pela apropriação de rendas é, na melhor das hipóteses, uma atividade de soma-zero. A caça de rendas não produz o crescimento de nada. Os esforços que ela envolve são direcionados a abocanhar uma parte cada vez maior do bolo, ao invés de fazê-lo crescer. Mas é ainda pior: a busca de rendas distorce a alocação de recursos e torna a economia mais frágil. É uma força centrípeta: o retorno da caça de rendas torna-se tão desproporcional que cada vez mais energia é dirigida a esta atividade, às custas de tudo o mais.

Países ricos em recursos naturais são tristemente famosos pela atividade de caça às rendas. É muito mais fácil tornar-se rico nestes lugares obtendo acesso aos recursos, em condições favoráveis, que produzindo bens ou serviços que beneficiam a população e elevam a produtividade. É por isso que estas economias foram tão mal sucedidas, a despeito de sua aparente riqueza. É fácil desdenhar e dizer: “Não somos a Nigéria, não somos o Congo”. Mas a dinâmica de caça às rendas é a mesma.


terça-feira, 26 de março de 2013

Nova prática, velha política


Rede Sustentabilidade, partido liderado por Marina Silva, tenta superar vícios políticos,
mas pairam dúvidas sobre como vai lidar com a realidade do sistema partidário



Pedro Rafael,
de Brasília (DF)

Fundado há um mês, a Rede Sustentabilidade deve se tornar o 31º partido político do Brasil. Liderada pela ex-ministra e ex-senadora, Marina Silva, a nova organização corre contra o relógio para oficializar sua legenda a tempo de pensar em lançar candidatos para as eleições de 2014. Para isso, depende da anuência de aproximadamente 500 mil assinaturas, em pelo menos nove estados, com prazo suficiente para que os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se manifestem, no máximo até outubro.

No ato de lançamento do partido, ocorrido em 16 de fevereiro, na capital federal, Marina Silva deixou claro que “não se trata de um esforço pensando apenas em eleição”. Mesmo assim, a prioridade do momento parece ser o recolhimento das assinaturas. No site da Rede, por exemplo, apoiadores podem se cadastrar como coletores de adesões. O mesmo empenho tem se repetido nas redes sociais.

Esquerda-direita

O tema do desenvolvimento sustentável foi adotado como eixo central na disputa ideológica que o partido quer levar para dentro do sistema político. A escolha tem a ver com a declaração de Marina Silva, de que não é “um partido de esquerda, nem de direita, mas a frente”. Para os fundadores da Rede, nenhuma agremiação partidária do país deu a devida dimensão para esse tema até agora.

“A política socioambiental do governo Dilma é um desastre, e de todos os outros governos sempre foi ruim. Nenhum partido, nem de esquerda, nem de direita, tem uma visão profunda no sentido de questionar o desenvolvimento que está aí. A esquerda tem uma visão mais social, que é importante, mas o centro do desenvolvimento é o neodesenvolvimentismo predatório. A direita tem um foco na economia liberal, mas o centro do desenvolvimento também é predatório. A pauta socioambiental é marginal em todos os partidos”, avalia Pedro Ivo Batista, membro da Comissão Nacional Provisória da Rede.

Militante histórico do movimento ambientalista, Ivo foi assessor muito próximo de Marina Silva na gestão à frente do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e é uma das lideranças mais engajadas na construção do novo partido.

O vice-presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, é um crítico atroz do novo partido. Para ele, a Rede tenta negar a disputa direita-esquerda. “Não considero um projeto político, nem partidário, e sim uma arregimentação fundamentalista. [O partido] não se define diante dos projetos da esquerda brasileira, não diz uma palavra sobre a reforma agrária. Todo mundo é a favor da sustentabilidade. A meu ver, o fato novo que temos que discutir é o que fazer para aliar desenvolvimento e sustentabilidade. Como deixar de fazer hidrelétrica e obter energia? Esse milagre nós estamos aguardando. Com esse tipo de dogma, é um projeto que não inova”, afirma.

Segundo o analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto Queiroz, o partido acerta ao eleger a sustentabilidade como elemento central, mas aponta dúvidas para essa ser a principal justificativa de conformação da Rede. “Claro que é um tema que permeia todas as áreas da convivência humana, é a novidade da atualidade. Ago Agora, não haveria necessidade de criação de mais um partido com esse propósito, com o compromisso com o meio ambiente. A Marina quis um partido para chamar de seu, porque ela não tem sido muito fiel aos partidos a que pertenceu”, critica.

Pedro Ivo rebate esse tipo de análise exemplificando a própria história. Ex-bancário e sindicalista, foi um dos fundadores do PT e militou na executiva da Central Única dos Trabalhadores (CUT). “Fui secretário nacional de meio ambiente do PT, mas o que levou um cara de esquerda e ecossocialista, como eu, a entrar na Rede, foi perceber que a sustentabilidade é o eixo central, algo que não havia ocorrido antes”.
No plano nacional, a surpreendente votação de Marina Silva, que chegou a quase 20 milhões de votos nas eleições presidenciais de 2010, desencadeou um processo de debate entre seus apoiadores sobre as forças partidárias capazes de abrigar esse “capital político”.

No Partido Verde (PV), legenda pela qual concorreu, Marina não obteve as mudanças desejadas e saiu em meados de 2011. “Como o PV negou-se a se democratizar, constituímos o movimento ‘nova política’. A ideia era ser um movimento supra e transpartidário e aglutinou jovens sem experiência em organização política e que se articulavam em redes sociais, além de pessoas ligadas a partidos. Marina sempre foi contrária a constituir um partido sem um amálgama social que pudesse conformar um projeto político”, acrescenta Pedro Ivo.

Entrando no jogo

O professor de Ciência Política da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, Francisco Fonseca, pondera a capacidade do partido de lidar no sistema partidário tal como está constituído.

“A Rede não será um partido inteiramente dentro do jogo político, nem fora. Na verdade, sinaliza uma dupla perspectiva: de um lado, uma organização programática, mais ideológica, mas também composto por forças políticas e parlamentares, inclusive empresários, que tendem mais a jogar a regra do jogo. A questão é saber se tem espaço para sobreviver no atual sistema político, até onde isso vai. Vejo mais perguntas do que respostas”, opina.

O deputado Domingos Dutra (PT-MA) é um dos políticos que estão apoiando a construção da Rede. Sem influência no PT de seu estado, Dutra viu seu partido emprestar apoio a “uma das últimas oligarquias do país”, comandada pela família Sarney, sem poder reverter a situação. O parlamentar ressalta a dificuldade para lidar no sistema político-partidário.

“A Rede está concordando com as regras do jogo atual, isso é um risco para qualquer partido. Se observar o que o PT defendia em 1980, não tem mais nada. Então, é mesmo um risco, mas estamos com disposição para enfrentá-lo, construir algo que seja diferente. Mais de 80% da população eleitoral brasileira não é filiada a partido político. E outros 30% simplesmente se abstiveram de votar nas últimas eleições, mesmo o voto sendo obrigatório. Então, penso que a Rede tenta inovar. Trata-se de uma disputa pela própria democracia”, aponta.