sábado, 3 de dezembro de 2011

O (Neo)Liberalismo



Contra o Liberalismo

Mao Tsetung

7 de Setembro de 1937





(...) O liberalismo, porém, rejeita a luta ideológica e preconiza uma harmonia sem princípios, o que dá lugar a um estilo decadente, filisteu, e provoca a degenerescência política de certas entidades e indivíduos, no Partido e nas outras organizações revolucionárias.
O liberalismo manifesta-se sob diversas formas: Constatamos que alguém está a agir mal mas, como se trata de um velho conhecido, de um conterrâneo, de um condiscípulo, de um amigo íntimo, de uma pessoa querida, de um antigo colega ou subordinado, não nos empenhamos no debate de princípios e deixamos as coisas correr, preocupados com manter a paz e a boa amizade. Ou então, para mantermos a boa harmonia, não fazemos mais do que críticas ligeiras, em vez de resolver a fundo os problemas.
O resultado é prejudicar-se tanto a coletividade como o indivíduo. Essa é uma primeira forma de liberalismo.
Em privado entregamo-nos a críticas irresponsáveis, em vez de fazermos ativamente sugestões à organização. Nada dizemos de frente às pessoas, mas falamos muito pelas costas; calamo-nos nas reuniões, e falamos a torto e a direito fora delas. Desprezamos os princípios de vida coletiva e deixamo-nos levar pelas inclinações pessoais. É uma segunda forma de liberalismo.
Desinteressamo-nos completamente por tudo que não nos afeta pessoalmente; mesmo quando temos plena consciência de que algo não vai bem, falamos disso o menos possível; deixamo-nos ficar sabiamente numa posição coberta e temos como única preocupação não ser apanhados em falta. É uma terceira forma de liberalismo.
Não obedecemos a ordens, colocamos as nossas opiniões pessoais acima de tudo. Não esperamos senão atenções por parte da organização e repelimos a disciplina desta. Eis uma quarta forma de liberalismo.
Em vez de refutar e combater as opiniões erradas, no interesse da união, do progresso e da boa realização do trabalho, entregamo-nos a ataques pessoais, buscamos questões, desafogamos o nosso ressentimento e procuramos vingar-nos. Eis uma quinta forma de liberalismo.
Escutamos opiniões erradas sem elevarmos uma objeção e deixamos até passar, sem informar sobre elas,  expressões  contra-revolucionárias,  ouvindo-as passivamente, como se de nada se tratasse. É uma sexta forma de liberalismo.
Quando nos encontramos entre as massas, não fazemos propaganda nem agitação, não usamos da palavra, não investigamos, não fazemos perguntas, não tomamos a peito a sorte do povo e ficamos indiferentes, esquecendo-nos de que somos comunistas e comportando-nos como um cidadão qualquer.  É uma sétima forma de liberalismo.
Vemos que alguém comete atos prejudiciais aos interesses das massas e não nos indignamos, não o aconselhamos nem obstamos à sua ação, não tentamos esclarecê-lo sobre o que faz e deixamo-lo seguir. Essa é uma oitava forma de liberalismo.
Não trabalhamos seriamente, mas apenas para cumprir formalidades, sem plano e sem orientação determinada, vegetamos — "enquanto for sacristão, contentar-me-ei com tocar os sinos". Essa é uma nona forma de liberalismo.
Julgamos ter prestado grandes serviços à revolução e damo-nos ares de veteranos; somos incapazes de fazer grandes coisas mas desdenhamos as tarefas pequenas; relaxamo-nos no trabalho e no estudo. Eis uma décima forma de liberalismo.
Cometemos erros, damo-nos conta deles mas não queremos corrigi-los, dando assim uma prova de liberalismo com relação a nós próprios. Eis a décima primeira forma de liberalismo.
Poderiam citar-se outros exemplos mais, mas os onze acima indicados são os principais.
Todos eles constituem manifestações do liberalismo.
O liberalismo é extremamente prejudicial nas coletividades revolucionárias. É um corrosivo que mina a unidade, afrouxa a coesão, engendra a passividade e provoca dissensões. Priva as fileiras revolucionárias duma organização sólida e duma disciplina rigorosa, impede a aplicação integral da linha política e separa as organizações do Partido das massas populares colocadas sob a direção deste. É uma tendência extremamente perniciosa.
A origem do liberalismo está no egoísmo da pequena burguesia, que põe em primeiro lugar os seus interesses pessoais, relegando para segundo plano os interesses da revolução. É dela que nasce o liberalismo ideológico, político e de organização.
Os liberais consideram os princípios do Marxismo como dogmas abstratos. Aprovam o Marxismo mas não estão dispostos a pô-lo em prática, ou a pô-lo integralmente em prática; não estão dispostos a substituir o liberalismo pelo Marxismo. Armam-se tanto de um como doutro: falam de Marxismo mas praticam liberalismo; aplicam o primeiro aos outros e o segundo a si próprios. Levam os dois na bagagem e encontram uma aplicação para cada um. É assim que pensam certos indivíduos.
O liberalismo é uma manifestação do oportunismo e está em conflito radical com o Marxismo. O liberalismo é a passividade. Objetivamente, serve o inimigo. É por essa razão que o inimigo se regozija quando o conservamos nas nossas fileiras. Tal é a natureza do liberalismo. Não deve pois haver lugar para ele nas fileiras da revolução.
Penetrados do espírito activo do Marxismo, devemos vencer a passividade do liberalismo. Um comunista deve ser aberto, fiel e ativo, colocar os interesses da revolução acima da sua própria vida e subordinar os interesses pessoais aos interesses da revolução. Em todos os momentos, seja onde for que se encontre, ele deve ater-se aos princípios justos e travar uma luta sem tréguas contra todas as ideias e ações erradas, de modo a consolidar a vida colectiva do Partido e reforçar os laços existentes entre este e as massas; um comunista deve preocupar-se mais com o Partido e as massas do que com os seus interesses pessoais, e atender mais aos outros do que a si próprio. Só quem atua assim pode ser considerado comunista.
Todos os comunistas fiéis, abertos, ativos e honestos, devem unir-se para lutar contra as tendências liberais de certos indivíduos entre nós, e conseguir chamá-los ao bom caminho. Essa é uma das nossas tarefas na frente ideológica.


Fonte: http://www.marxists.org/portugues/mao/1937/09/07.htm

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Eric Hobsbawm na Revista New Left Review


PUBLICADA NA “NEW LEFT REVIEW”
Aos 92 anos, o historiador britânico Eric Hobsbawm continua um feroz crítico da prevalência do modelo político-econômico dos EUA. Para ele, o presidente americano Barack Obama, ao lidar com as consequências da crise econômica, desperdiçou a chance de construir maneiras mais eficazes de superá-la.
”Podemos desejar sucesso a Obama, mas acho que as perspectivas não são tremendamente encorajadoras”, diz, na entrevista abaixo. “A tentativa dos EUA de exercer a hegemonia global vem fracassando de modo muito visível.”
Hobsbawm discute ainda questões globais contemporâneas -como as tentativas de criar Estados supranacionais, a xenofobia e o crescimento econômico chinês- à luz do que expressou em livros como “Era dos Extremos” e “Tempos Interessantes” (ambos publicados pela Cia. das Letras).


PERGUNTA - “Era dos Extremos” termina em 1991, com um panorama de avalanche global -o colapso das esperanças de avanços sociais da era de ouro [para Hobsbawm, 1949-73]. Quais são as mudanças mais importantes desde então?
ERIC HOBSBAWM - Vejo quatro mudanças principais. Primeiro, o deslocamento do centro econômico do mundo do Atlântico Norte para o sul e o leste da Ásia. Isso já estava começando no Japão nas décadas de 1970 e 80, mas a ascensão da China desde os anos 1990 vem fazendo uma diferença real.
Em segundo lugar, é claro, a crise mundial do capitalismo, que vínhamos prevendo, mas que, mesmo assim, levou muito tempo para ocorrer. Em terceiro, a derrota retumbante da tentativa dos EUA de exercer a hegemonia global solo a partir de 2001.
Em quarto lugar, a emergência de um novo bloco de países em desenvolvimento, como entidade política -os Brics [Brasil, Rússia, Índia e China]-, não tinha acontecido quando escrevi “Era dos Extremos”.
E, em quinto lugar, a erosão e o enfraquecimento sistemático da autoridade dos Estados: dos Estados nacionais no interior de seus territórios e, em grandes regiões do mundo, de qualquer tipo de autoridade de Estado efetiva. Isso se acelerou em um grau que eu não teria previsto.

PERGUNTA - O que mais o surpreendeu desde então?
HOBSBAWM - Nunca deixo de me espantar com a pura e simples insensatez do projeto neoconservador, que não apenas fez de conta que a América fosse o futuro, mas chegou a pensar que tivesse formulado uma estratégia e uma tática para alcançar esse objetivo. Pelo que consigo enxergar, ele não tinha uma estratégia coerente, em termos racionais.
Em segundo lugar -fato muito menor, mas significativo-, o ressurgimento da pirataria, algo que já tínhamos em grande medida esquecido; isso é novo.
E a terceira coisa, que é ainda mais local: a derrocada do Partido Comunista da Índia (Marxista) em Bengala Ocidental [no leste da Índia], algo que eu realmente não teria previsto.

PERGUNTA - O sr. visualiza uma recomposição política daquilo que foi no passado a classe trabalhadora?
HOBSBAWM - Não em sua forma tradicional. Marx [1818-83] acertou, sem dúvida, quando previu a formação de grandes partidos de classe em determinado estágio da industrialização. Mas esses partidos, quando foram bem-sucedidos, não operaram puramente como partidos da classe trabalhadora: se queriam estender-se para além de uma classe estreita, o faziam como partidos do povo, estruturados em torno de uma organização inventada pela classe trabalhadora e voltada a alcançar os objetivos dela.
Mesmo assim, havia limites à consciência de classe. No Reino Unido, o Partido Trabalhista nunca conquistou mais de 50% dos votos. O mesmo se aplica à Itália, onde o Partido Comunista era muito mais um partido do povo.
Na França, a esquerda era baseada sobre uma classe trabalhadora relativamente fraca, mas que conseguiu se reforçar como sucessora essencial da tradição revolucionária.
O declínio da classe operária manual na indústria parece, de fato, ter atingido seu estágio terminal.
Houve três outras mudanças negativas importantes. Uma delas, é claro, é a xenofobia -que, para a maior parte da classe trabalhadora é, nas palavras usadas certa vez por [August] Bebel, “o socialismo dos tolos”: proteja meu emprego contra pessoas que estão competindo comigo.
Em segundo lugar, boa parte da mão de obra e do trabalho nos setores que a administração pública britânica qualificava no passado como “graus menores e manipulativos” não é permanente, mas temporária. Assim, não é fácil enxergá-la como tendo potencial de ser organizada.
A terceira e mais importante mudança é, a meu ver, a divisão crescente gerada por um novo critério de classe: a saber, a aprovação em exames de escolas e universidades como critério de acesso a empregos. Pode-se dizer que se trata de uma meritocracia, mas ela é medida, institucionalizada e mediada por sistemas de ensino.
O que isso fez foi desviar a consciência de classe da oposição aos patrões para a oposição a representantes de alguma elite: intelectuais, elites liberais, pessoas que se erguem como superiores a nós.

PERGUNTA – Que comparações o sr. traçaria entre a crise atual e a Grande Depressão?
HOBSBAWM - [A crise de] 1929 não começou com os bancos -eles só caíram dois anos mais tarde. O que aconteceu, na verdade, foi que a Bolsa de Valores desencadeou uma queda na produção, com um índice muito mais alto de desemprego e um declínio real muito maior na produção do que havia ocorrido em qualquer momento até então.
A depressão atual levou mais tempo sendo preparada que a de 1929, que pegou quase todos de surpresa. Deveria ter sido claro desde cedo que o fundamentalismo neoliberal gerou uma instabilidade enorme nas operações do capitalismo. Até 2008, isso pareceu afetar apenas as áreas periféricas -a América Latina nos anos 1990 e no início da década de 2000; o Sudeste Asiático e a Rússia.
Parece-me que o verdadeiro indício de algo grave acontecendo deveria ter sido o colapso da Long-Term Capital Management [fundo de investimentos sediado nos EUA], em 1998, que provou como estava errado o modelo inteiro de crescimento. Mas o incidente não foi visto como tal. Paradoxalmente, a crise levou vários empresários e jornalistas a redescobrirem Karl Marx como alguém que tinha escrito algo interessante sobre uma economia globalizada moderna.
A economia mundial em 1929 era menos global do que é hoje. Isso exerceu algum efeito, é claro. A existência da União Soviética não exerceu efeito concreto sobre a Depressão, mas seu efeito ideológico foi enorme: significava que havia uma alternativa.
Desde os anos 1990, temos assistido à ascensão da China e das economias emergentes, fato que vem realmente exercendo um efeito concreto sobre a depressão atual, na medida em que esses países vêm ajudando a manter a economia mundial muito mais equilibrada do que ela estaria sem eles.

PERGUNTA - E o que dizer das consequências políticas?
HOBSBAWM - A Depressão de 1929 levou a um desvio avassalador para a direita, com a exceção notável da América do Norte, incluindo o México, e da Escandinávia.
O efeito da crise atual não é tão nítido. Podemos imaginar que grandes mudanças políticas devem ocorrer não apenas nos EUA ou no Ocidente, mas quase certamente na China.

PERGUNTA - O sr. antevê que a China continue a resistir ao declínio?
HOBSBAWM - Não há nenhuma razão em especial para prever que a China pare de crescer de uma hora para outra. A depressão causou um choque grave ao governo chinês, na medida em que paralisou muitas indústrias, temporariamente. Mas o país ainda se encontra nos estágios iniciais do desenvolvimento econômico, e há espaço enorme para expansão.
É claro que o país ainda enfrenta grandes problemas; sempre há pessoas que se perguntam se a China vai conseguir continuar unida. Mas acho que as razões reais e ideológicas para que as pessoas desejem que a China se mantenha unida continuam muito fortes.

PERGUNTA - Que avaliação o sr. faz da administração Obama?
HOBSBAWM - As pessoas ficaram tão satisfeitas com a eleição de um homem como ele, especialmente em um momento de crise, que pensaram que certamente seria um grande reformador, que faria o que Roosevelt [1933-45, responsável pelo New Deal, série de programas econômicos e sociais contra a Grande Depressão] fez.
Mas Obama não o fez. Ele começou mal. Se compararmos os primeiros cem dias de Roosevelt aos primeiros cem dias de Obama, o que salta à vista é a disposição de Roosevelt em aceitar assessores não oficiais, em experimentar algo novo, comparada à insistência de Obama em se conservar no centro. Acho que ele desperdiçou sua chance.

PERGUNTA - A solução de dois Estados, conforme visualizada no momento, é uma perspectiva digna de crédito para a Palestina?
HOBSBAWM - Pessoalmente, duvido que ela exista no momento. Seja qual for a solução possível, nada vai acontecer enquanto os americanos não decidirem mudar totalmente de posição e aplicar pressão sobre Israel.

PERGUNTA - Existem lugares do mundo nos quais o sr. acha que projetos positivos e progressistas ainda estejam vivos ou tenham chances de ser reativados?
HOBSBAWM - Na América Latina, com certeza, a política e o discurso público geral ainda são conduzidos nos velhos termos do iluminismo -liberais, socialistas, comunistas.
Esses são os lugares onde se encontram militaristas que falam como socialistas -que “são” socialistas. Encontram-se fenômenos como [o presidente] Lula, baseado em um movimento da classe trabalhadora, e [o presidente boliviano Evo] Morales.
Para onde isso vai levar é outra questão, mas a velha linguagem ainda pode ser falada, e os velhos modos políticos ainda estão disponíveis.
Não estou inteiramente certo quanto à América Central, embora existam indícios de um ligeiro “revival” da tradição da revolução no próprio México -não que isso vá muito longe, na medida em que o México já foi virtualmente integrado à economia americana.
É possível que projetos progressistas possam renascer na Índia, devido à força institucional da tradição secular de Nehru [que se tornou premiê após a independência do país, em 1947]. Mas isso não parece penetrar muito entre as massas.
Além disso, o legado dos velhos movimentos trabalhistas, socialistas e comunistas na Europa continua bastante forte.
Desconfio que, em algum momento, a herança do comunismo, por exemplo nos Bálcãs ou até mesmo em parte da Rússia, possa se manifestar de maneiras que não podemos prever. O que vai acontecer na China eu não sei. Mas não há dúvida de que eles [os chineses] estão pensando em termos diferentes, não em termos maoístas ou marxistas modificados.

PERGUNTA - O sr. sempre foi crítico do nacionalismo como força política. Também se manifestou contra violações de soberania nacional cometidas em nome de intervenções humanitárias. Após a falência do internacionalismo nascido do movimento trabalhista, que tipos são desejáveis hoje?
HOBSBAWM – Em primeiro lugar, o humanitarismo, o imperialismo dos direitos humanos, não tem muito a ver com internacionalismo. É indicativo ou de um imperialismo renascido, que encontra nele uma desculpa adequada para cometer violações de soberania de Estados -podem ser desculpas absolutamente sinceras-, ou então, o que é mais perigoso, é uma reafirmação da crença na superioridade permanente da região que dominou o planeta do século 16 até o final do século 20.
O internacionalismo, que é a alternativa ao nacionalismo, é uma coisa espinhosa. Ou é um slogan politicamente vazio, como foi, concretamente falando, no movimento trabalhista internacional -não queria dizer nada específico-, ou é uma maneira de assegurar uniformidade para organizações centralizadas e poderosas como a Igreja Católica ou a Internacional Comunista.
O internacionalismo significava que, como católico, você acreditava nos mesmos dogmas e participava das mesmas práticas, não importa quem você fosse ou onde vivesse. O mesmo acontecia, teoricamente, com os partidos comunistas. Não é realmente isso o que queríamos dizer com “internacionalismo”.
O Estado-nação foi e continua a ser o quadro em que são tomadas todas as decisões políticas, domésticas e externas. É possível que o islã missionário e fundamentalista constitua uma exceção a essa regra, abarcando Estados, mas isso ainda não foi demonstrado concretamente.

PERGUNTA - Há obstáculos inerentes a qualquer tentativa de extrapolar as fronteiras do Estado-nação?
HOBSBAWM – Economicamente e na maioria dos outros aspectos -inclusive culturalmente, até certo ponto-, a revolução das comunicações criou um mundo genuinamente internacional, no qual há poderes de decisão que se transnacionalizam, atividades que são transnacionais e, é claro, movimentos de ideias, comunicações e pessoas que são mais facilmente transnacionais do que antes.
Na política, contudo, não se vê nenhum sinal de que isso esteja acontecendo, e é essa a contradição básica no momento. Uma das razões pelas quais não vem acontecendo é que, no século 20, a política foi democratizada em grau muito grande -a massa da população comum se envolveu nela. Para essa massa, o Estado é essencial para suas operações cotidianas normais e para suas possibilidades de vida.
Tentativas de fragmentar o Estado internamente, pela descentralização, foram empreendidas, em sua maioria nos últimos 30 ou 40 anos, e algumas delas não deixaram de ter algum sucesso -na Alemanha, com certeza, a descentralização vem tendo alguma medida de sucesso e, na Itália, a regionalização vem sendo benéfica.
Mas as tentativas de criar Estados supranacionais não têm funcionado. A União Europeia é o exemplo mais óbvio disso.
Ela foi prejudicada, até certo ponto, pelo fato de seus fundadores terem pensado precisamente em termos de um Superestado análogo a um Estado nacional, apenas maior -sendo que essa não era uma possibilidade, creio, e hoje com certeza não é.

PERGUNTA - O nacionalismo foi uma das grandes forças motrizes da política no século 19 e em boa parte do século 20. Que o sr. diz da situação atual?
HOBSBAWM - Não há dúvida alguma de que o nacionalismo foi, em grande medida, parte do processo de formação dos Estados modernos, que exigiu uma forma de legitimação diferente da do Estado tradicional teocrático ou dinástico. A ideia original do nacionalismo era a criação de Estados maiores, e me parece que essa função unificadora e de expansão foi muito importante.
Um exemplo típico foi o da Revolução Francesa, na qual, em 1790, pessoas apareceram dizendo: “Não somos mais delfineses ou sulistas -somos todos franceses”.
Em uma etapa posterior, dos anos 1870 em diante, vemos movimentos de grupos no interior desses Estados impulsionando a criação de seus Estados independentes.
Era reconhecido, mesmo que não pelos próprios nacionalistas, que nenhum desses novos Estados-nações era, de fato, étnica ou linguisticamente homogêneo.
Mas, depois da Segunda Guerra [1939-45], os pontos fracos das situações existentes foram enfrentados, não apenas pelos vermelhos, mas por todos, pela criação proposital e forçada da homogeneidade étnica. Isso provocou uma quantidade enorme de sofrimento e crueldade e, no longo prazo, também não funcionou.
Não posso deixar de pensar que a função dos Estados separatistas pequenos, que se multiplicaram tremendamente desde 1945, mudou. Para começo de conversa, eles são reconhecidos como existentes.
Antes da Segunda Guerra, os Miniestados -como Andorra, Luxemburgo e todos os outros- nem sequer eram vistos como parte do sistema internacional, exceto pelos colecionadores de selos. A ideia de que tudo, até a Cidade do Vaticano, hoje é um Estado, potencialmente membro das Nações Unidas, é nova.
A função histórica de criar uma nação como Estado-nação deixou de ser a base do nacionalismo. Pode-se dizer que não é mais um slogan muito convincente.
Hoje, porém, o fator xenofóbico do nacionalismo é cada vez mais importante. Quanto mais a política foi democratizada, maior foi o potencial para isso. Trata-se de algo muito mais cultural que político -basta pensar na ascensão do nacionalismo inglês ou escocês nos últimos anos-, mas nem por isso menos perigoso.

PERGUNTA - O fascismo não incluía essas formas de xenofobia?
HOBSBAWM – O fascismo ainda foi, até certo ponto, parte da investida para criar nações maiores. Não há dúvida de que o fascismo italiano foi um grande passo à frente na conversão de calabreses e úmbrios em italianos; mesmo na Alemanha, foi apenas em 1934 que os alemães puderam ser definidos como alemães, e não alemães pelo fato de serem suábios, francos ou saxões.
É verdade que os fascismos alemão e europeu central e oriental foram acirradamente contrários a outsiders -judeus, em grande medida, mas não apenas eles.
E, é claro, o fascismo forneceu uma garantia menor contra os instintos xenofóbicos.

PERGUNTA – As dinâmicas separatistas e xenofóbicas do nacionalismo atuam hoje nas margens da política mundial?
HOBSBAWM - Sim, embora existam regiões em que o nacionalismo causou danos enormes, como no sudeste da Europa.
Ainda é verdade, é evidente, que o nacionalismo -ou o patriotismo, ou a identificação com um povo específico, que não precisa necessariamente ser definido por critérios étnicos- seja um enorme fator de legitimação dos governos.
Isso é claramente o caso na China. Um dos problemas da Índia, hoje, é que não existe nada exatamente assim por lá.

PERGUNTA - Como o sr. prevê a dinâmica social da imigração contemporânea hoje? Haverá a emergência gradual de outro caldeirão cultural na Europa, não dessemelhante ao americano?
HOBSBAWM - Mas o caldeirão cultural nos EUA deixou de sê-lo desde os anos 1960. Ademais, no final do século 20, a migração já era algo realmente muito diferente das migrações de períodos anteriores, em grande medida porque, ao emigrar, as pessoas já não rompem os vínculos com o passado no mesmo grau em que o faziam antes.
É possível continuar a ser guatemalteco mesmo vivendo nos EUA. Também há situações como as da UE, nas quais, concretamente, a imigração não gera a possibilidade de assimilação. Um polonês que vem para o Reino Unido não é visto como nada além de um polonês que vem trabalhar no país.
Isso é claramente novo e muito diferente da experiência de pessoas da minha geração, por exemplo -a geração dos emigrados políticos, não que eu tenha sido um-, na qual nossa família era britânica, porém culturalmente nunca deixávamos de ser austríacos ou alemães; mas, apesar disso, acreditávamos realmente que deveríamos ser ingleses.
Acredito realmente que é essencial conservar as regras básicas da assimilação -que os cidadãos de um país particular devem comportar-se de determinada maneira e gozar de determinados direitos, que esses comportamentos e direitos devem defini-los e que isso não deve ser enfraquecido por argumentos multiculturais.
A França integrou, apesar de tudo, mais ou menos tantos de seus imigrantes estrangeiros quanto os EUA, relativamente falando, e, mesmo assim, o relacionamento entre os locais e os ex-imigrantes é quase certamente melhor lá. Isso acontece porque os valores da República Francesa continuam a ser essencialmente igualitários e não fazem nenhuma concessão pública real.
Seja o que for que você faça no âmbito pessoal -era também esse o caso nos EUA no século 19-, publicamente esse é um país que fala francês. A dificuldade real não será tanto com os imigrantes quanto com os locais. É em lugares como Itália e Escandinávia, que não tinham tradições xenofóbicas prévias, que a nova imigração vem criando problemas sérios.
PERGUNTA - Hoje é amplamente disseminada a ideia de que a religião tenha retornado como força imensamente poderosa. O sr. vê isso como um fenômeno fundamental ou mais passageiro?
HOBSBAWM - Está claro que a religião -entendida como a ritualização da vida, a crença em espíritos ou entidades não materiais que influenciariam a vida e, o que não é menos importante, como um elo comum entre comunidades- está tão amplamente presente ao longo da história que seria um equívoco enxergá-la como fenômeno superficial ou que esteja destinado a desaparecer, pelo menos entre os pobres e fracos, que provavelmente sentem mais necessidade de seu consolo e também de suas potenciais explicações do porquê de as coisas serem como são.
Existem sistemas de governo, como o chinês, que não possuem concretamente qualquer coisa que corresponda ao que nós consideraríamos ser religião. Eles demonstram que isso é possível, mas acho que um dos erros do movimento socialista e comunista tradicional foi optar pela extirpação violenta da religião em épocas em que poderia ter sido melhor não o fazer.
É verdade que a religião deixou de ser a linguagem universal do discurso público; e, nessa medida, a secularização vem sendo um fenômeno global, embora apenas em algumas partes do mundo ela tenha enfraquecido gravemente a religião organizada.
Para as pessoas que continuam a ser religiosas, o fato de hoje existirem duas linguagens do discurso religioso gera uma espécie de esquizofrenia, algo que pode ser visto com bastante frequência entre, por exemplo, os judeus fundamentalistas na Cisjordânia -eles acreditam em algo que é evidentemente tolice, mas trabalham como especialistas nisso.
O declínio das ideologias do iluminismo deixou um espaço político muito maior para a política religiosa e as versões religiosas de nacionalismo. Mas muitas religiões estão claramente em declínio.
O catolicismo está lutando arduamente, mesmo na América Latina, contra a ascensão de seitas evangélicas protestantes, e tenho certeza de que está se mantendo na África apenas graças a concessões aos hábitos e costumes sociais que eu duvido que tivessem sido feitas no século 19.
As seitas evangélicas protestantes estão em ascensão, mas não está claro até que ponto são mais que uma minoria entre os setores sociais com mobilidade ascendente, como era o caso antigamente com os não conformistas na Inglaterra.
A única exceção é o islã, que vem continuando a se expandir sem nenhuma atividade missionária efetiva nos últimos dois séculos.
Parece-me que o islã possui grandes trunfos que favorecem sua expansão contínua -em grande medida, porque confere às pessoas pobres o sentimento de que valem tanto quanto todas as outras e que todos os muçulmanos são iguais.
PERGUNTA – Não se poderia dizer o mesmo do cristianismo?
HOBSBAWM – Mas um cristão não crê que vale tanto quanto qualquer outro cristão. Duvido que os cristãos negros acreditem que valham tanto quanto os colonizadores cristãos, enquanto alguns muçulmanos negros acreditam nisso, sim. A estrutura do islã é mais igualitária, e o elemento militante é mais forte no islã.
Recordo-me de ter lido que os mercadores de escravos no Brasil deixaram de importar escravos muçulmanos porque eles insistiam em rebelar-se sempre. Esse apelo encerra perigos consideráveis -em certa medida, o islã deixa os pobres menos receptivos a outros apelos por igualdade.
Os progressistas no mundo muçulmano sabiam desde o início que não haveria maneira de afastar as massas do islã; mesmo na Turquia, tiveram que encontrar alguma forma de convivência -aliás, esse foi provavelmente o único lugar onde isso foi feito com êxito.

PERGUNTA - A ciência foi uma parte central da cultura da esquerda antes da Segunda Guerra. O sr. acha que o destaque crescente das questões ambientais deverá reaproximar a ciência da política radical?
HOBSBAWM - Tenho certeza de que os movimentos radicais vão se interessar pela ciência. O ambiente e outras preocupações geram razões fundamentadas para combater a fuga da ciência e da abordagem racional aos problemas, fuga que se tornou bastante ampla a partir dos anos 1970 e 80. Mas, com relação aos próprios cientistas, não creio que isso vá acontecer.
Diferentemente dos cientistas sociais, não há nada que leve os cientistas naturais a se aproximarem da política. Historicamente falando, eles, na maioria dos casos, têm sido apolíticos ou seguiram a política padrão de sua classe.

PERGUNTA - Em “Tempos Interessantes” [publicado em 2002], o sr. expressou reservas ao que eram, na época, modismos históricos recentes. O sr. acha que o cenário historiográfico continua relativamente inalterado?
HOBSBAWM – Minha geração de historiadores, que de modo geral transformou o ensino da história, além de muitas outras coisas, procurou essencialmente estabelecer um vínculo permanente, uma fertilização mútua, entre a história e as ciências sociais; era um esforço que datava dos anos 1890.
A disciplina econômica seguiu uma trajetória diferente. Dávamos como certo que estávamos falando de algo real: de realidades objetivas, embora, desde Marx e a sociologia do conhecimento, soubéssemos que as pessoas não registram a verdade simplesmente como ela é.
Mas o que era realmente interessante eram as transformações sociais. A Grande Depressão foi instrumental nesse aspecto, porque reapresentou o papel exercido por grandes crises nas transformações históricas -a crise do século 14, a transição ao capitalismo.
Éramos um grupo que procurava resolver problemas, que se preocupava com as grandes questões. Havia outras coisas cuja importância diminuíamos: éramos tão contrários à história tradicionalista, à história dos governantes e figuras importantes, ou mesmo à história das ideias, que rejeitávamos isso tudo.
Em algum momento da década de 1970, ocorreu uma mudança acentuada. Em 1979-80 a [revista de história] “Past & Present” publicou uma troca de ideias entre Lawrence Stone e mim sobre o “revival da narrativa” -”o que está acontecendo com as grandes perguntas “por quê’?”.
Os historiadores oriundos de 1968 não se interessavam mais pelas grandes perguntas -pensavam que todas já tinham sido respondidas. Estavam muito mais interessados nos aspectos voluntários ou pessoais. O [periódico] “History Workshop” foi um desenvolvimento tardio desse tipo.
Por outro lado, houve alguns avanços positivos. O mais positivo destes foi a história cultural, que todos nós, inegavelmente, tínhamos deixado de lado. Não prestamos atenção suficiente à história do modo como ela de fato se apresenta a seus atores.

PERGUNTA – Se o sr. tivesse que escolher tópicos ou campos ainda inexplorados e que representam desafios importantes para historiadores futuros, quais seriam?
HOBSBAWM - O grande problema é um problema muito geral. Segundo padrões paleontológicos, a espécie humana transformou sua existência com velocidade espantosa, mas o ritmo das transformações tem variado tremendamente.
Os marxistas focaram, com razão, as transformações no modo de produção e em suas relações sociais como sendo geradoras de transformações históricas.
Contudo, se pensarmos em termos de como “os homens fazem sua própria história”, a grande questão é a seguinte: historicamente, comunidades e sistemas sociais buscaram a estabilização e a reprodução, criando mecanismos para prevenir-se contra saltos perturbadores no desconhecido. Como, então, humanos e sociedades estruturados para resistir a transformações dinâmicas se adaptam a um modo de produção cuja essência é o desenvolvimento dinâmico interminável e imprevisível?
Os historiadores marxistas poderiam beneficiar-se da pesquisa das operações dessa contradição fundamental entre os mecanismos que promovem transformações e aqueles que são voltados a opor resistência a elas.

Esta entrevista foi publicada originalmente na edição de janeiro/fevereiro da revista britânica “New Left Review”.
Tradução de Clara Allain.

Mundo Big Brother

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Agência Pública - [Pratap Chatterjee, do Bureau of Investigative Journalism] Último vazamento do WikiLeaks revela uma indústria bilionária que vende equipamentos de espionagem a regimes repressores. As empresas no lucrativo ramo são europeias e americanas, mas há também uma brasileira

Uma indústria multibilionária secreta está oferecendo sistemas de ponta que permitem que governos identifiquem, rastreiem e monitorem qualquer um através de seus telefones e computadores.
É o que uma coletânea de centenas de e-mails promocionais e outros materiais de marketing obtidos pelo WikiLeaks revelam.
Uma empresa alemã oferece a habilidade de rastrear “opositores políticos”; uma companhia italiana alega poder controlar smartphones remotamente e usá-los para escutar conversações e fotografar os donos; uma empresa americana permite usuários “ver o que eles [os espionados] veem”; uma empresa sul-africana oferece ferramentas para gravação de bilhões de chamadas telefônicas e armazenamento eterno para o material.
Este material está sendo publicado pelo WikiLeaks e pela ONG Privacy International, um grupo de Direitos Humanos sediado em Londres.
Os arquivos jogam luz sobre uma indústria sombria que vale 5 bilhões de dólares e está crescendo rapidamente. Este tipo de propaganda não é aberta ao público. Pelo contrário: elas são enviadas a contatos-chave – geralmente agências governamentais e forças policiais – em feiras de negócios que são fechadas ao público e à imprensa.
Um roteiro de Hollywood?
Os documentos foram coletados de mais de 130 empresas sediadas em 25 países, desde o Brasil até a Suiça, e revelam uma gama de tecnologias sofisticadíssimas que parecem ter saído diretamente de um filme de Hollywood.
Mas essas empresas são reais. E dão consistência aos ativistas que garantem que esse setor que está se proliferando constitui uma nova e não regulada indústria de armas.
“Estes documentos revelam uma indústria vendendo ferramentas não apenas para alvos de intercepções legais…  mas para vigilância em massa. Estas ferramentas permitem a  governos vasculhar e-mails, conversas e mensagens de textos de populações inteiras, armazenar, procurar e analisar. Assim como o Google guia sua busca na web, elas permitem a um policial à paisana rastrear qualquer um que diz algo rude sobre um ditador. Não é de se espantar que empresas dessas venderam para países como Egito, Síria e Irã”, diz Ross Anderson, professor de Engenharia de Segurança na Universidade de Cambridge.
A indústria alega que vende apenas equipamentos de “interceptação legal” para autoridades oficiais: a polícia, o exército e agências de inteligência.
Mas as malas-diretas de venda ostentam equipamentos de espionagem discretos, e a disponibilidade destes equipamentos preocupa ativistas porque permote abusos por forças de segurança repressivas e oficiais corruptos.
“Tecnologia deste tipo pode ser tão letal quanto balas diretamente vendidas por empresas de munições”, diz o deputado Lord Alton, que já levantou muitas questões referentes a esta indústria.
O que é oferecido?
“Para quê amostragem, quando você pode monitorar tráfego de rede sem maiores despesas?”, alardeia uma mala-direta da Endace, empresa sediada na Nova Zelândia.
“Monitoramento total de todas as operadoras para evitar qualquer vazamento de inteligência é fundamental para agências governamentais”, diz a empresa indiana Clear Trail.
A China Top Communications, sediada em Pequim, alega ter como hackear as senhas de mais de 30 provedores de correio eletrônico, incluindo Gmail, “em tempo real e  através de um meio passivo (SIC)”.
Na linguagem deliberadamente obscura da indústria de vigilância, “interceptação passiva” é o que acontece sem que o “alvo” – ou a pessoa sendo espionada – perceba que está sendo observado.
No Brasil, a empresa Suntech, de Florianópolis, oferece serviços para para operadoras de telecomunicações como interceptação legal, retenção de dados e gerenciamento de rede.
No mercado global, esse tipo de tecnlogia é usada abusivamente por governos repressores para ajudar a desmantelar dissidentes.
Em outubro, o Bureau revelou que equipamentos de filtragem de rede da Blue Coat Systems, sediada na Califórnia, estavam sendo usados para censurar o tráfego de internet na Síria, apesar das sanções dos EUA àquele país.
A empresa depois afirmou que o equipamento teria sido desviado por um importador dos Emirados Árabes Unidos.
Agora, o Bureau comprovou que equipamentos de uma empresa do Reino Unido está sendo usada na Síria; e que a Líbia usava tecnologia produzida na França para monitorar pessoas em Londres – algumas delas apenas com ligações remotas com dissidentes.
Uma investigação da Bloomberg recentemente descobriu um sistema de vigilância sendo instalado pelo governo sírio por uma empresa italiana, Area.
As notícias apareceram enquanto o país estremecia por protestos massivos que deixaram 3.500 mortos. Os advogados da Area anunciaram na última segunda-feira que a empresa teria cancelado as vendas.
Mas o maior motivo de preocupação é a velocidade com que esta tecnologia está avançando.
“As ferramentas propagandeadas nestas malas-diretas demonstram uma capacidade de vigilância em massa que antes era inimaginável. Isso faz grampos telefônicos parecerem coisa de criança”, diz Eric King, da ONG Privacy International. “Alguns dos regimes mais tiranos do mundo estão comprando esses equipamentos para monitorar o comportamento e as comunicações de cada um de seus cidadãos – e a tecnologia é tão eficiente que eles podem executar isso com o mínimo de recursos humanos”.
Empresa inglesa vende para o Irã – com as bênçãos da inteligência britânica
Enquanto a exportação de bombas e armas convencionais é estritamente controlada, as tecnologias de vigilância – que podem ser tão mortais quanto armas se caírem em mãos erradas – passam por pouco controle ou escrutínio público.
A reportagem descobriu que o centro de espionagem do governo britânico, GCHQ, avaliou a venda de tecnologia de rastreamento de telefonia móvel ao Irã pela empresa Creativity Software, de Surrey, e aprovou o negócio.
Marietje Schaake, membro holandês do Parlamento Europeu, apela para que a legislação da União Europeia previna que tais tecnologias sejam vendidas para regimes repressores.
Por enquanto, não há nenhum movimento claro para introduzir-se algo concreto.
Talvez parte do problema esteja no fato de que a tecnologia oferecida é complexa e rapidamente substituída por novas versões.
Na próxima semana, por exemplo, a Conferência de Sistemas de Apoio a Inteligência da Ásia e Pacífico, em Kuala Lumpur, irá revelar novos avanços e técnicas ainda melhores de espionagem.
Até quando será que os governos vão poder ignorar esta indústria florescente?


Fonte: http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=22210%3Amundo-big-brother&catid=233%3Areportagens&Itemid=156

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Famiglia Felice




È dedicata alla famiglia? Un uomo che non impegna la famiglianon sarà mai un vero uomo.

Non lasciare mai nessuno al di fuori della famiglia sapere che cosa stai pensando.

Se un uomo onesto come lei fanno i nemici, poi sono stati i miei nemicie che si teme.

Un avvocato con una valigetta può rubare più di mille uomini armati.

Don Vito Corleone

Uma Vez Colônia, Sempre Colônia? A Moda da Escravidão Brasileira


Dia 30 de novembro de 2011 vai ser um dia marcado para se acreditar realmente que temos ainda muito o ranço colonial escravista. Esse dia a multinacional da área da confecção Zara se negou a aceitar o TAC (Termo de Ajuste de Conduta) imposta pelo Ministério Público do Trabalho, nesse Termo contém além da multa de R$20 milhões, que se tenha de extinguir a "terceirização da terceirização" nas suas oficinas de costura  e as subcontratações na cadeia de produção de responsabilidade da empresa. Simplesmente a Zara ignorou as intervenções do MPT e continua a vender suas roupas como se não estivesse fazendo nada de anormal.  O mais lamentável é que não é a única; a C&A, Pernambucanas, Marisa e várias lojas são coniventes com a "terceirização escravocrata" e também não se interessam se vão aumentar os lucros com o trabalho escravo.
Escravos produzem a moda contemporânea
Dessa forma, a Zara e as demais demonstram as suas relações com o Estado e povo do Brasil, as relações que estão intrínsecas desde 500 anos atrás, com Estado paternal e trabalhador subserviente e dominado. Os donos do meio de produção antes escravização índios (negros da terra) e depois seguiram a lógica escravista de negros africanos, hoje a lógica do capital faz escravizar além de brasileiros, os bolivianos, peruanos e asiáticos. Como na época colonial o escravismo é moda também no agronegócio, grandes plantações de cana-de-açúcar se utilizam dessa mão-de-obra. Existe também a produção de carvão, a mineração e o emprego doméstico que lembra muito bem o tempo da Casa Grande.
Mas não passou.
Enquanto isso, nós que não somos escravizados (não mesmo, que horror!) nos preparamos para as compras de fim de ano nas principais lojas escravistas que existem no Brasil. Vamos assistir isso de braços cruzados (ou comprando)? Vamos nos mobilizar, criar consciência? Podemos até pedir para atores globais fazerem um vídeo contra essas empresas também, lógico com uma ajuda de um abaixo-assinado. Será que vão autorizar o uso da imagem deles contra os anunciantes?

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Último Discurso de Salvador Allende


Discurso do Presidente Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973, dia do golpe de Estado que derrubou o governo da Unidade Popular e implantou a sanguinária ditadura militar comandada pelo general Pinochet. O Palácio presidencial foi bombardeado pelos militares e Allende morreu de armas na mão resistindo ao golpe.
Últimas Palavras à Nação

Salvador Allende Gossens

11 de setembro de 1973





Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento: soldados do Chile, comandantes-em-chefe titulares, o almirante Merino, que se autodesignou comandante da Armada, e o senhor Mendoza, general rastejante que ainda ontem manifestara sua fidelidade e lealdade ao Governo, e que também se autodenominou diretor geral dos carabineros.

Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores:

Não vou renunciar!

Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. [Eles] têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos.

Trabalhadores de minha Pátria: quero agradecer-lhes a lealdade que sempre tiveram, a confiança que depositaram em um homem que foi apenas intérprete de grandes anseios de justiça, que empenhou sua palavra em que respeitaria a Constituição e a lei, e assim o fez.

Neste momento definitivo, o último em que eu poderei dirigir-me a vocês, quero que aproveitem a lição: o capital estrangeiro, o imperialismo, unidos à reação criaram o clima para que as Forças Armadas rompessem sua tradição, que lhes ensinara o general Schneider e reafirmara o comandante Araya, vítimas do mesmo setor social que hoje estará esperando com as mãos livres, reconquistar o poder para seguir defendendo seus lucros e seus privilégios.

Dirijo-me a vocês, sobretudo à mulher simples de nossa terra, à camponesa que nos acreditou, à mãe que soube de nossa preocupação com as crianças.

Dirijo-me aos profissionais da Pátria, aos profissionais patriotas que continuaram trabalhando contra a sedição auspiciada pelas associações profissionais, associações classistas que também defenderam os lucros de uma sociedade capitalista.

Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e deram sua alegria e seu espírito de luta.

Dirijo-me ao homem do Chile, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque em nosso país o fascismo está há tempos presente; nos atentados terroristas, explodindo as pontes, cortando as vias férreas, destruindo os oleodutos e os gasodutos, frente ao silêncio daqueles que tinham a obrigação de agir. Estavam comprometidos. A historia os julgará.

Seguramente a Rádio Magallanes será calada e o metal tranqüilo de minha voz não chegará mais a vocês. Não importa. Vocês continuarão a ouvi-la. Sempre estarei junto a vocês. Pelo menos minha lembrança será a de um homem digno que foi leal à Pátria. O povo deve defender-se, mas não se sacrificar. O povo não deve se deixar arrasar nem tranqüilizar, mas tampouco pode humilhar-se.

Trabalhadores de minha Pátria, tenho fé no Chile e seu destino.

Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se.

Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

Viva o Chile!

Viva o povo!

Viva os trabalhadores!

Estas são minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão. Tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição.


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